Usar ou não a camisa da seleção? Pelo menos nos últimos quatro anos, essa foi uma dúvida entre os torcedores brasileiros, já que inevitavelmente qualquer símbolo nacional era associado ao movimento conservador encabeçado por Jair Bolsonaro (PL). Entretanto, com o resultado das eleições e a realização da Copa do Mundo, não só a amarelinha, mas a bandeira nacional e o verde e amarelo vêm sendo retomados pelo povo.
O servidor público Pedro Hosken, fez questão de vestir o uniforme para acompanhar os jogos da Seleção. Trabalhando em uma instituição pública de educação, o torcedor fica aliviado com a retomada do símbolo.
“Eu tinha receio de usar a camisa e ser associado a apoiadores do atual presidente, um político que desprezou a ciência e que não se sensibilizou com a morte de milhares de brasileiros na pandemia. Já teve ocasião que até expliquei que estava usando a camisa, mas não era um apoiador. E já teve ocasião que simplesmente preferi não usá-la”, conta.
Juan Gomes, também virou um adepto da amarelinha. O torcedor assíduo encarou o uso da camisa da seleção como uma tarefa política. Professor de futebol para adolescentes, Juan acredita que é preciso ampliar o leque de referências para as futuras gerações sobre os símbolos nacionais.
“Eles [adolescentes] gostam dessa camisa, desses símbolos e eu sei que isso pode impactar as decisões deles no futuro. E quando comecei a estudar sobre o fascismo, vi que eles sempre se apropriam dos símbolos nacionais como uma tática. Encarei isso como parte de uma tarefa maior” declara.
Falso nacionalismo é estratégia histórica da direita
Juan tem razão. A professora do departamento de História da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Miriam Hermeto explica que é comum a regimes autoritários a apropriação de símbolos pátrios, como bandeiras, hinos e datas simbólicas. Foi assim, por exemplo, nos regimes de Getúlio Vargas e durante a ditadura militar no país. A pesquisadora conta que os elementos são utilizados para criar na sociedade um sentimento de nacionalismo, hegemonia e patriotismo.
Miriam afirma ainda que a relação dos brasileiros com os símbolos nacionais é instável e frágil, o que se reflete, por exemplo, na dificuldade da população em cantar corretamente o hino nacional. Na avaliação da pesquisadora, essa relação só se fortalece quando há um incentivo intencional de governos e projetos, o que deixa a população mais vulnerável. Por isso, para Miriam, a retomada que tem sido feita dos símbolos pátrios é fundamental para a construção de uma sociedade mais democrática.
“Os símbolos nacionais têm uma função na construção de uma comunidade imaginada, algo que pode unir aquilo que é diverso. E isso pode ajudar a nossa democracia, construindo essa comunidade a qual todos nós podemos pertencer democraticamente”, pontua.
Uso político pode ser proibido por lei
Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2749/2022, de autoria do deputado Márcio Macêdo (PT-SE), que propõe a proibição do uso de símbolos nacionais como instrumentos políticos, ideológicos ou partidários. Atualmente, o projeto está em avaliação na Comissão de Constituição e Justiça da Casa.
Edição: Larissa Costa