Nesta semana, a proposta de criação de uma moeda comum entre a Argentina e o Brasil gerou uma grande repercussão na internet. E é claro que, junto com isso, vieram as fake news.
O desenvolvimento de uma moeda regional, com o foco na integração econômica, teria como principal finalidade a sua utilização em transações comerciais e financeiras entre os países, como uma alternativa ao uso do dólar.
Isso não significa que o real e o peso argentino iriam acabar para dar espaço a essa nova moeda, justamente porque a moeda comum em nada tem relação com a nossa moeda nacional. Em termos práticos, essa proposta significa um avanço (e retomada) de uma relação estratégica entre os dois países e além disso, viabilizaria uma menor dependência direta do dólar, diminuindo assim a vulnerabilidade externa das economias latino-americanas.
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Isso sem falar dos benefícios especialmente à nível geopolítico para o nosso país. Se o real se torna a moeda mais forte do bloco, a dívida da Argentina seria em real, o que daria ao Brasil um poder de influência decisivo sobre os países do bloco. Além disso, o fato de o Brasil se mostrar disposto a retomar a liderança na América Latina pode criar um ambiente mais favorável ao acordo entre o Mercosul e a União Europeia.
Todavia, existe uma série de condições para serem atendidas pelos países antes da adoção dessa proposta. É preciso, por exemplo, que os países tenham certa compatibilidade no que diz respeito a integração econômica, comercial, bancária, financeira e também fiscal. Essa não é uma medida implementada de um dia para o outro.
E ainda é bom ressaltar que essa é uma proposta que já foi feita anteriormente por outros governos. Inclusive pelo último governo. Em 2019, Paulo Guedes, o então ministro da Economia, defendeu a ideia de adoção de uma moeda única pelo Mercosul. Na época, ao ser questionado sobre os prejuízos dessa medida para o Brasil, Jair Bolsonaro, ex-presidente, havia dito: “em todo casamento, alguém perde alguma coisa e ganha outras”.
Alarde desnecessário
Mas, mais do que a discussão dos benefícios dessa proposta de adoção de uma moeda comum, o que tem chamado a atenção é o fato de a imprensa empresarial estar criando um alarde desnecessário sobre propostas como essas. E isso acontece justamente em um momento em que existem muitas outras pautas mais urgentes.
Que os meios de comunicação passaram por uma série de transformações e avanços nas últimas décadas é um consenso entre todos. Mas, no momento em que vemos discussões infundadas e desnecessárias pautadas por essa mídia com o único e principal objetivo de criar pânico na população e gerar o caos político, temos a certeza de que cada vez mais as fake news nos impõe um desafio diário de superação e aprendizados sobre como lidar com isso de forma cada vez mais rápida e eficiente.
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Ainda, essa questão é problemática pois a dificuldade de responder a casos de fake news tem gerado muitos ruídos de comunicação e isso, atrelado à popularização do acesso à internet, é tudo o que não precisamos, principalmente no cenário atual, em que nossa democracia tem sido colocada à prova a todos os instantes.
O cenário que compõe a mesa hoje é o fato de que as notícias chegam em milhões de pessoas em questão de segundos.
E aqui não quero dizer que desmentir fake news deva a ser o foco central do atual governo, longe disso. É sabido que existem pautas muito mais urgentes e relevantes a serem tratadas. Mas, a ampla divulgação e alarde de propostas como a criação da moeda comum repleta de falácias e fake news, por exemplo a chamada “auxílio reclusão” divulgada há alguns dias, só reforça os desafios que a esquerda segue lidando.
Ao mesmo tempo, o avanço e a presença do governo desmentindo as notícias absurdas que são propagadas é o nosso grande aliado no processo de reconstrução do nosso país e na defesa diária da nossa democracia. Disso não podemos abrir mão.
Dito isso, enxergo que a melhoria e o avanço em direção a uma comunicação cada vez mais nítida e objetiva entre o governo e a população são um desafio decisivo no que diz respeito tanto à retomada do processo de união entre as instituições brasileiras, quanto ao estancamento da proliferação da extrema direita no país.
A nós, enquanto cidadãos, acredito que cabe seguir em frente, de forma organizada e coletiva, disputando cada espaço.
Diana Chaib é economista e doutoranda em economia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da UFMG. É especialista em macroeconomia e tem interesses nas áreas de desenvolvimento econômico e economia da China.
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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Larissa Costa