Minas Gerais

Coluna

Artigo | A barbárie da pós-modernidade e o ataque de 8 de janeiro

Imagem de perfil do Colunistaesd
"A busca do gozo sem interrupção coloca os indivíduos uns contras os outros. Uma pessoa pode ser morta só porque é considerada culpada pelo fracasso do outro" - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Ataque contra a democracia é demência coletiva

O neoliberalismo e a pós-modernidade são farinhas de um mesmo saco. O capitalismo retrocedeu ao tempo do mercantilismo do século XVIII, no qual produtores de mercadorias e comerciantes podiam escravizar, ter todo tipo de privilégio e contar com a proteção dos reis.

Bernard Stiegler, filósofo francês, afirma que o que faz a grandiosidade dos EUA é a criação de necessidades e desejos, criando a aversão contra tudo que é velho e obsoleto. O indivíduo é bombardeado e persuadido a comprar para não se constituir em uma pessoa desprezível. Não poder comprar ou resistir a comprar é tornar-se malvisto.

:: Receba notícias de Minas Gerais no seu Whatsapp. Clique aqui ::

Os alienados pelo desejo de comprar formam a sociedade rebanho. A figura de retórica “rebanho” é muito forte, mas compreensível. Seu uso denuncia o fato de que quem não tem opinião própria, não pensa por si mesmo, tem maior sentimento de conformidade, prevalecendo um comportamento gregário semelhante ao dos rebanhos.

Antes, as pessoas ficavam célebres porque tinham qualidades excepcionais e eram importantes, mas, na atualidade, são importantes só porque são famosos.

Bolsonaristas são incapazes de criações artísticas porque eles não têm empatia

O sociólogo alemão, Ulrich Beck (2003), procurou analisar os efeitos das perdas com a desmontagem dos sistemas de seguridade e das tradições de proteção familiar, que contribuíam para a sobrevivência. Ou seja, milhões de pessoas que foram desenraizadas; de gente que foi apartada de suas tradições; de gente que perdeu o chão que habitava; gente que perdeu o emprego que garantia a existência da família.

Só no governo Bolsonaro mais de 36 milhões de brasileiros foram levados para a pobreza, entre os quais, mulheres que se prostituíram como forma de pagar as contas da família; homens que passaram a furtar metais de bens públicos e privados como placas de sinalização, grades de bueiros e cabos transmissores de energia, como meio de sobrevivência.


Sedes dos Três Poderes alvo de ataques terroristas por militantes de extrema direita em 8 de janeiro / Valter Campanato/Agência Brasil

Crises e violência

Segundo a Organização Mundial da Saúde, a crise social e econômica, gerada pela globalização tem contribuído para aumento de crises conjugais, violência, insegurança, sofrimento mental e suicídios.

A busca do gozo sem interrupção coloca os indivíduos uns contras os outros. Uma pessoa pode vir a ser morta só porque é considerada culpada pelo fracasso do outro.

Manifestantes e terroristas são das classes média alta e, por isso, se lançam em luta como em busca de um inimigo fictício

O ataque contra a democracia em Brasília no dia 8 de janeiro, resulta dessa demência coletiva. Os bolsonaristas são pessoas tristonhas, acabrunhadas e que não gostam de arte; que não sabem fazer um solfejo musical sequer; nunca assistiram a uma peça teatral; odeiam as artes de vanguarda nos gêneros cinema, artes plásticas e literatura. Se distanciaram da civilidade e da civilização moderna.

Diz o ator Emílio Dantas que os bolsonaristas são incapazes de criações artísticas porque eles não têm empatia. Baseados em um evangelismo torpe, condenam artistas, cientistas e intelectuais como inimigos da fé e instrumentos do anticristo. Em função desse atraso ou dessa regressão, atacam as conquistas democráticas e humanistas da segunda metade do século XX, com a proclamação dos direitos humanos e os postulados do Concílio Vaticano II.

Civilização ou barbárie

Imbuídos dessa ideologia, se julgam na obrigação de subverter a ordem democrática, matar, espancar e promover quebradeiras. Manifestantes e terroristas são das classes média alta e de proprietários temerosos de perder posições sociais e privilégios e, por isso, se lançam em luta como em busca de um inimigo fictício.

Ouvimos falar da barbárie de outros povos do mundo, mas, todo o dia temos notícias de crianças recém-nascidas atiradas no lixo; pais e padrastos estuprando filhas e enteadas; filhos matando pais; marido matando mulher; gangues contra gangues; jovens de classe média matando mendigos e agredindo empregadas domésticas. Nos últimos dez anos a Comissão Pastoral da Terra registrou 63.757 trabalhadores em situação de escravidão no Brasil. Desse total, o Ministério do Trabalho conseguiu libertar somente 38.000 pessoas.

Há um século Rosa Luxemburgo disse que a acumulação sem limites, em mãos de poucos e o consequente aumento da pobreza, levaria o mundo à barbárie. Esta conjectura tornou-se uma dura realidade.

 Antônio de Paiva Moura é professor de História, aposentado da UEMG e UNI-BH. Mestre em História pela PUC-RS.

---

Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

---

:: Leia outros artigos de Antonio de Paiva Moura em sua coluna :: 

Edição: Elis Almeida