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A educação ambiental brasileira como aliada do conhecimento tradicional

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"A EA pode ser instrumento de preservação e disseminação dos conhecimentos tradicionais dos povos originários brasileiros. " - Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil
O desenvolvimento da educação ambiental brasileira necessita assimilar a identidade cultural

A educação ambiental (EA) brasileira passou por diversas transformações de cunho político desde a década 1980, especialmente no que consiste às demandas globais da questão ambiental após a Agenda 21 e de grandes conferências das Nações Unidas, que avançaram o debate da educação alinhada às diretrizes da sustentabilidade.

No Brasil, a partir da década de 1980, com o processo de redemocratização e a promulgação da Constituição Federal de 1988, a educação ambiental passa a compor de forma mais intensa as políticas ambientais, fortalecendo as discussões sobre o meio ambiente no país.

A Política Nacional de Educação Ambiental, instituída pela Lei nº 9795/99, se estabeleceu diante da necessidade de regularização das informações na esfera pública ou privada, da inclusão e ampliação das tratativas entre desenvolvimento sustentável e as práticas educacionais, e da ampliação dos espaços institucionais em prol da educação ambiental, a partir de diretrizes interdisciplinares e transdisciplinares.

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A educação ambiental brasileira, de acordo com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMbio), agrega os processos de construção de valores sociais, conhecimentos, práticas e competências individuais e coletivas que criam condições para a conservação do meio ambiente, consumo responsável e a formação humana, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, balizado na preservação e conservação da sociobiodiversidade para as sociedades atuais e futuras.

Escolas verdes

Contudo, a educação ambiental possui diversas e complementares frentes de análise no que consiste a abordagem do meio ambiente, com uma pluralidade de correntes de pensamento e de prática. Entre as possibilidades de diálogos multidisciplinares, cabe destacar o papel da educação ambiental na proteção e difusão dos saberes tradicionais sobre o meio ambiente.

A EA orientada para os conhecimentos tradicionais pauta-se em desenvolver – além de uma consciência coletiva para conservação dos ecossistemas – a manutenção dos conhecimentos e práticas das comunidades tradicionais, assim como impulsionar medidas pela legitimidade e continuidade intergeracional dos patrimônios cultural e genético resguardados pelos povos originários. 

A EA pode ser instrumento de preservação e disseminação dos conhecimentos tradicionais dos povos originários brasileiros. Proteger os conhecimentos tradicionais representa a manutenção de saberes das populações tradicionais, acumulados ao longo do tempo de forma coletiva pelas experiências ancestrais e das relações com a natureza, o que não exclui as transformações e adaptações realizadas pela capacidade criativa dos membros das comunidades tradicionais diante das demandas atuais. 

As iniciativas que demonstram a soma desses esforços, podem ser identificadas nas chamadas “escolas de saberes da floresta”, “escola bosque”, “escolas verdes” entre outras denominações. Essas representam instituições que promovem atividades educacionais baseadas nos conhecimentos dos povos tradicionais, em práticas socioculturais e sustentáveis.

No panorama mundial, foi desenvolvida pela Comissão Nacional de Cultura e Artes da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) o programa Escola de Tradições Vivas (School of Living Traditions), em 1995. O programa atua na criação de mecanismos pelos quais as tradições, as práticas e os conhecimentos indígenas e tradicionais sejam preservados e transmitidos às gerações mais jovens, com foco na salvaguarda do patrimônio cultural imaterial das comunidades locais.

Na América Latina, é possível destacar a experiência do Equador com a Escola Bosque da comunidade Choco Andino. Coordenada pela comunidade local, a escola possui foco de atuação no ensino superior e realiza atividades de formação em pesquisa biológica, ecologia tropical, bioconstrução e de ecologia de florestas tropicais.

No Brasil, iniciativas similares foram voltadas particularmente à educação sustentável, entretanto, poucas até o momento possuem o enfoque na manutenção e difusão de saberes oriundos de conhecimentos tradicionais da floresta como instrumento fundamental em sua política.

A Escola do Parque de Santarém no estado do Pará representa um desses casos brasileiros. Fundada em 2010, a Escola Parque é atuante na educação ambiental como formação complementar em práticas sustentáveis por meio de cursos existentes nos currículos das escolas públicas convencionais do município.

Ampliar o alcance da EA

Cabe ressaltar a necessidade de a educação ambiental brasileira atuar para criação de um sistema educacional diferenciado nessas “escolas verdes” pelo país, de forma a perpetuar, disseminar e proteger os saberes do povo das florestas brasileiras, considerando a diversidade social de cada região, suas comunidades tradicionais, extrativistas, indígenas e quilombolas.

O desenvolvimento da educação ambiental brasileira necessita assimilar a identidade cultural e o sentido de pertencimento à natureza, criar condições de proteção e manutenção dos saberes tradicionais nas práticas educacionais, conscientizar sobre relação entre a diversidade biológica e a cultural, reconhecer o valor do conhecimento tradicional e do patrimônio cultural e genético que seus povos preservam, ampliando espaços de formação em saberes tradicionais pensados, organizados e coordenados pelos povos detentores desses saberes.

No limite, trata-se de ampliar o alcance da educação ambiental como instrumento político e educacional de reconhecimento, valorização, preservação de saberes ancestrais responsáveis pela própria formação da sociedade brasileira, para garantir a perpetuação do patrimônio cultural, autonomia dos nossos povos e  intercâmbios entre o conhecimento tradicional associado e a ciência brasileira, que permitam a repartição justa e equitativa de benefícios pelos usos de recursos genéticos, gerados e preservados pelos saberes tradicionais dos povos da floresta.

 

Luz Marina Lopes de Almeida é doutoranda em economia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar), da UFMG.

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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

Edição: Larissa Costa