Em Minas Gerais, tem se tornado cada vez mais comum decisões judiciais impactarem o desenvolvimento de greves de trabalhadores. No início deste mês, por exemplo, a Justiça determinou a suspensão do movimento realizado por trabalhadores da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), que questionam a entrega, por parte do governo de Romeu Zema (Novo), de hospitais públicos para a iniciativa privada.
A determinação do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) foi publicada no dia 7 de junho, apenas dois dias após o início do movimento grevista. A ordem judicial ainda previa a cobrança de multas entre R$ 10 mil e R$ 300 mil, caso a greve não fosse finalizada.
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Rede Fhemig (Sindpros), Carlos Augusto Martins, conta que o fato ocorrido neste mês não é isolado e que as intervenções judiciais se tornaram o principal problema para as lutas da categoria.
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“Por mais que a gente consiga fazer um movimento forte, bem mobilizado e com grande adesão, ele acaba se perdendo. Ou seja, hoje em dia não basta fazer uma mobilização forte para pressionarmos o governo em relação à pauta. Esse é o nosso maior problema. Temos que correr contra o tempo, sabendo que é questão de dias para que a greve seja derrotada judicialmente”, avalia o dirigente sindical.
Assim como os trabalhadores da saúde, os metroviários de Belo Horizonte denunciam que, em todas as greves que realizaram, foram penalizados pela Justiça, com determinações de suspensão ou restrição do movimento.
Em fevereiro deste ano, quando a categoria paralisou as atividades contra a venda da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU-MG), o Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG) determinou que 70% dos trens deveriam funcionar durante a greve.
Como a decisão não foi respeitada, o Sindicato dos Empregados em Transportes Metroviários e Conexos de Minas Gerais (Sindimetro/MG) foi multado e teve suas contas bloqueadas.
Para Carine Cristina da Silva Tavares, que é diretora jurídica do Sindimetro/MG, a postura da Justiça tem penalizado os trabalhadores e não busca responsabilizar as empresas, que se negam a negociar.
“A greve acontece justamente por conta da intransigência da empresa em negociar. Mas, o Judiciário sempre responsabiliza os trabalhadores. Assim, ele vira mais um mecanismo de opressão da classe trabalhadora, ao invés de promover a resolução do conflito”, avalia Carine.
Direito de greve
A greve é um direito reconhecido na Constituição Federal de 1988, uma conquista fruto de muitas lutas e reivindicações dos trabalhadores por melhores condições salariais e de trabalho. Contudo, ainda que exista a sua autorização, desde a década de 1990 o Judiciário vem restringindo esse direito, delimitando e criminalizando o movimento sindical. É o que avaliam juristas e trabalhadores.
O advogado trabalhista e sindical, Ronaldo Pagotto, explica que o direito de greve é “a possibilidade de interrupção do trabalho sem desconto de salários e outros prejuízos”. Nos últimos 200 anos, essa é a forma mais eficiente dos trabalhadores conquistarem vitórias nas negociações com os patrões.
Porém, ele avalia que, devido às posições restritivas do judiciário brasileiro, ainda que a legislação reconheça o direito de greve, ele vem sendo cada vez mais restringido.
“Com a presença cada vez mais intensa do Judiciário, impondo condições para o exercício do dilito, a luta, a conquista de direitos e o direito de greve, como multas e sanções como forma de pressionar o sindicato e os trabalhadores e a própria decisão sobre o conficalismo se enfraquecem”, analisa.
“Se a greve não paralisa a operação, ela não tem força para pressionar para a negociação. E, sem pressão real, as negociações ocorrem a frio e são sempre (ou quase sempre) piores do que as negociações cujas categorias têm o instrumento de greve muito presente e com capacidade real de exercício”, complementa Ronaldo Pagotto.
Relembre
Em reportagem publicada em março deste ano, o Brasil de Fato MG demonstrou que a articulação entre o governo de Minas e o Judiciário tem servido para rifar direitos dos trabalhadores. Uma das estratégias políticas utilizadas pelo governador é a judicialização dos movimentos grevistas.
No caso dos trabalhadores em educação da rede estadual, a entidade representativa da categoria, o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE/MG), está com as contas bancárias bloqueadas, devido a uma ação, movida por Zema e acolhida pela Justiça no ano passado, que acarretou em uma multa de mais de R$ 3 milhões.
O motivo da sanção foi a realização de uma greve que cobrava o direito ao piso salarial nacional, que não é cumprido pelo governo de Minas.
“Quando existem conflitos e reivindicações que o governo não quer atender, ele recorre ao Poder Judiciário. É lamentável a falta de habilidade política e de disposição para atender as pautas da educação”, comenta a coordenadora-geral do Sind-UTE/MG Denise Romano.
A reportagem procurou o Tribunal de Justiça de Minas Gerais para comentar sobre o tema. Até o fechamento da matéria, não tivemos retorno. O espaço segue aberto para manifestações.
Edição: Elis Almeida