Em toda a bacia do Rio Doce, há relatos de aumento de câncer, problemas gastrointestinais e alergias
“Aqui quem manda é a Samarco, e a Renova só retira nossos direitos”. A denúncia foi feita pela Dila, do Córrego do Café, durante a assembleia organizada pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), em Cachoeira Escura, na última segunda-feira (17). Foi uma importante noite de escuta às pessoas atingidas pelo crime da Vale/Samarco/BHP na região, com a presença de três ministérios do governo Lula (Saúde, Desenvolvimento Agrário e Secretaria-Geral da Presidência da República).
Já são sete anos desde o crime. A ausência do poder público nos territórios é assustadoramente real. Não há políticas públicas no atendimento à saúde, não há amparo na área da saúde mental, não há transparência de informações a respeito da qualidade da água, que o povo sabe que está contaminada e a Renova insiste em uma falsa normalidade.
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As pessoas estão abandonadas, são obrigadas a lidar com uma estrutura, a Renova, criada para blindar as mineradoras, mas que atua na repetição da violação de direitos. Ou nas palavras de outra moradora de Cachoeira Escura: “o réu é o atingido e a atingida é a empresa”.
A questão da água contaminada e o consequente adoecimento da população foi a questão mais tratada pelas pessoas. Por toda a bacia, os relatos de aumento de câncer, problemas gastrointestinais, alergias na pele e queda de cabelo são recorrentes. E nenhuma política pública enfrentou essa realidade nos últimos sete anos.
A fome e as dificuldades financeiras são outra realidade muito denunciada. “Quando meus meninos estavam com fome, eu ia até o rio e pescava”, desabafou outra moradora. O rio era uma importante fonte de sustento, comida, lazer e comunhão. O crime da Vale/Samarco/BHP tirou o rio das pessoas. Qualquer repactuação precisa tratar de trazer a vida para o Rio Doce, que ficou abandonado nesses anos.
Recurso da repactuação deve ser investido na bacia do Rio Doce
No mesmo dia, mais cedo, a população de Naque também foi escutada. A Cristiana, de Pedra Corrida, sintetizou: “o dinheiro precisa ser investido onde a gente mora”. Eu me lembrei do acordo feito pelo governo Zema com a Vale sobre o crime em Brumadinho e toda a bacia do Paraopeba. Nesse acordo, até a fiação da Cidade Administrativa seria trocada com recursos que deveriam reparar os impactos do crime na vida das pessoas.
Dinheiro desse acordo também foi usado para a privatização do metrô de Belo Horizonte. Então, a luta para que o recurso da repactuação fique na bacia do Rio Doce e cumpra a função de reparação é muito estratégica.
Ainda na cidade de Naque, com forte presença de pescadores, outro impacto foi denunciado: na Previdência Social. Com a interrupção das atividades econômicas, centenas de pessoas ficaram sem contribuir. Agora, estão adoecidos e sem assistência. Estão invisíveis aos olhos do poder público, mais uma vez.
Beatriz Cerqueira é professora e deputada estadual (PT-MG).
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Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Larissa Costa