Minas Gerais

Coluna

Noiva do Cordeiro, uma comunidade matriarcal

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A comunidade Noiva do Cordeiro é localizada no município Belo Vale - Foto: Instagram/ Noiva do Cordeiro
As moças do arraial Noiva do Cordeiro cultivaram a liberdade

No final do século XIX, na paróquia de Santana do Paraopeba, então município de Bonfim, Senhorinha Lima, casou-se com o descendente de francês, o jovem Artur Pierre. Três meses depois, abandonou o marido e foi morar com Francisco Pereira de Araújo, no lugarejo denominado Noiva do Cordeiro, hoje pertencente ao município de Belo Vale. A partir daí ela teve que viver isolada em uma fazenda.

Todas as gerações de mulheres, descendentes de Senhorinha Lima, sofreram pesadas discriminações. As comunidades vizinhas tratavam-nas, injustamente, como prostitutas. Com isso elas tinham dificuldades de se casarem formalmente e passaram a escolher seus parceiros permanentes fora do casamento. Essa discriminação que vigora até hoje determinou a formação de uma comunidade onde as mulheres são predominantes.

Elas fazem de tudo na vida social e econômica da fazenda. Pela documentação da comarca de Bonfim, hoje em custódia no Arquivo Público Municipal, podemos perceber que a comunidade queria excluir Senhorinha Lima do convívio social. Em 1902, moradores próximos ao arraial Noiva do Cordeiro, moveram um processo judicial de despejo contra ela e suas filhas. Unidas, aprenderam a resistir às pressões da sociedade para não saírem sem rumo pelo mundo.

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As moças do arraial Noiva do Cordeiro cultivaram com resiliência o propósito de viver em liberdade e não se submeterem ao jugo machista do meio rural. Desde os primeiros anos do século XX, as filhas de Senhorinha Lima foram contra as rígidas normas de conduta estabelecidas pelo catolicismo e protestantismo. Em 1990 acabaram fechando a igreja local, comunicando ao pastor que cada uma das mulheres iria seguir a religião que quisesse, porém, em cultos fora da comunidade.

Segundo alguns estudos sociológicos, a mentalidade dos habitantes de pequenas cidades e do meio rural, são mais conservadoras e têm as atividades orientadas pelas tradições ao contrário dos habitantes das grandes cidades.

Mas na comunidade Noiva do Cordeiro, as mulheres fugiram dessa norma e assumiram o mando da economia; mantêm escola infantil própria; as uniões estáveis só são aceitas se os parceiros não interferirem no modo particular de viver da companheira e das demais mulheres da comunidade. Para evitar a endogamia e a consanguinidade, elas preferem buscar parceiros fora da comunidade e dai uma série de notícias falsas de que elas estavam à procura de homens para a prática de amor livre.

Só se tem notícia de outra comunidade feminina como a de Noiva do Cordeiro, a das Musuo, no Sudeste da China. Mas as mulheres de Noiva do Cordeiro procuraram modernizar-se nas atividades econômicas; fazer estudos universitários; nos estilos de vida e até da estética corporal. E é isso que tem atraído interesses de sociólogos e antropólogos.

 

Antônio de Paiva Moura é autor do livro Médio Paraopeba e seu saber viver, professor de História, aposentado da UEMG e UNI-BH. Mestre em História pela PUC-RS

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Leia outros artigos de Antônio de Paiva Moura em sua coluna no Brasil de Fato MG

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Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

Edição: Elis Almeida