Eles atuam, até hoje, na interface entre o Estado nacional e o mercado
A propósito desta sexta, 11 de agosto, dia do advogado:
Max Weber supunha que as grandes civilizações tinham, em geral, um grupo social que lhes dava substância, um grupo mais importante que influenciaria, mais que os outros, as características daquelas civilizações. Eram os rabinos na Judéia, os filósofos na Grécia antiga, os brâmanes na Índia, os mandarins na China. Weber os chamava de traggers - em alemão, pilastra, sustentáculo, viga-mestra de uma construção.
Haveria, na civilização moderna, grupo(s) semelhante(as)? Se sim, quem seriam esses traggers? Os cientistas e tecnólogos? Os empresários? Os burocratas? Os padres, pastores e religiosos? Os trabalhadores? Os militares?
Malgrado a importância de todos, penso que nenhum deles. Tenho a intuição que os traggers da modernidade são, juntamente com os agentes de mídia, os juristas. Os juristas operam um sistema, o Direito, que, em sua faceta pós-tradicional, foi fundamental na constituição dessa modernidade, aliando-se à burguesia e aos governantes centralizadores.
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E, desse momento original, constitutivo do Direito moderno - em que juristas se fortaleceram na medida em que fortaleceram a concentração concomitante e inter-relacionada de capital e de poder político -, eles atuam, até hoje, na ligação, na interface, das duas macro-instituições cruciais da vida atual: o Estado nacional e o mercado capitalista.
Os juristas são o grupo mais importante da modernidade, mas isso não significa excelência intelectual ou superioridade moral. Nesses pontos, não são melhores ou piores que outros. Assim como a modernidade tem coisas boas e ruins, os juristas, seus principais portadores, representantes, são profundamente contraditórios.
Por um lado, embasam e legitimam essa dominação mal percebida, "opaca", como gosta de repetir Jessé Souza, do Estado e do mercado sobre as pessoas, capturadas nas teias quase invisíveis, mas férreas dessa "cotidianeidade tecnicamente orientada", como dizia Weber. Por outro, em seus melhores momentos e representantes, colocam freios, limites, "civilizam", por assim dizer, os aspectos mais brutais dessa dominação. Limitam, mas também legitimam a dominação, e legitimam, em boa medida, ao limitar.
Acompanhar a adaptação e o destino desses traggers da modernidade frente às transformações geopolíticas e tecnológicas do mundo atual será fundamental para tentar vislumbrar em que direção estamos rumando.
Rubens Goyatá Campante é doutor em Sociologia pela UFMG e pesquisador do Centro de Estudos Republicanos Brasileiros (Cerbras).
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Leia outros artigos de Rubens Goyatá Campante em sua coluna no Brasil de Fato MG.
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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.
Edição: Larissa Costa