Em uma prévia da conduta almejada pelos governos de direita no país, na manhã desta segunda-feira, 14 de agosto, povos originários que se manifestavam em Jujuy foram despejados pela polícia sem nenhuma ordem judicial. A repressão ilegal acontece um dia após o candidato a presidente pelo partido de direita 'A Liberdade Avança', Javier Milei, ficar em primeiro lugar Primárias Abertas no país - uma prévia das eleições gerais de outubro – e demonstram a nova face da Argentina, que tem como conduta a “mão dura” contra protestos sociais.
Os povos originários se encontravam quase dois meses resistindo em bloqueios de rodovias em Jujuy, no noroeste da Argentina, onde protestavam contra reforma constitucional assinada pelo governador de Jujuy, Geraldo Morales, do partido “Juntos por el Cambio”, também de direita. A reforma facilita a exploração do lítio, habilita a utilização de terras originárias e ainda tenta amordaçar a todos ao criminalizar protestos, em ações comuns dos regimes ditatoriais.
Morre jornalista em protesto
Já na última sexta-feira (11), manifestações por todo o território pediam justiça pela morte de Facundo Molares Schoenfeld, fotojornalista e militante morto em repressão da polícia portenha durante “ato contra a farsa eleitoral e pela democracia do povo”. O ato ocorreu no dia anterior, no Obelisco, um dos pontos turísticos mais emblemáticos da capital federal, Buenos Aires.
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Facundo Morales, além de jornalista e militante, foi um ex-guerrilheiro das Farc e prisioneiro da ditadura Boliviana, em 2019. O governo da Argentina conseguiu recuperar a sua liberdade em 2020, devido ao grave estado de saúde que se encontrava na Bolívia. Em solo argentino, chegou a ser alvo de processo por parte da Colômbia, que desistiu da imputação devido ao acordo de paz com as Farc.
Morales foi pressionado contra o chão pela polícia quando participava de um ato no Obelisco convocado pelas organizações “Votamos Luchar y Rebelión Popular”.
Diversas organizações de Diretos Humanos da Argentina firmaram um abaixo-assinado onde expressaram condenação ao “assassinato do militante e fotojornalista pelas mãos da Polícia da Cidade Autônoma de Buenos Aires, devido à brutal repressão que esta força de segurança exerceu contra manifestantes pacíficos”, escreveram.
De acordo com os manifestantes, o uso feroz e irresponsável da força aplicada na repressão que culminou na morte de Facundo Molares não é um fato isolado e se deve ao desprezo que a Prefeitura tem pela integridade física e pela vida das pessoas que a denunciam. Eles ainda pedem pelo “julgamento dos que agiram na repressão e também dos funcionários e políticos, a começar pelo Chefe do Governo, que tem a responsabilidade política de dirigir as forças de segurança portenha”.
A força policial que reprimiu violentamente a manifestação no Obelisco integra o aparato municipal de Buenos Aires, que tem como prefeito Rodríguez Larreta, do partido “Juntos por el Cambio”, o mesmo partido de Macri, ex-presidente da Argentina e que ganhou nesse domingo as eleições para a prefeitura de Buenos Aires, substituindo Larreta.
Acorrentamento
No mesmo dia em que Facundo Molares foi assassinado, membros de povos originários de Jujuy que se encontram em Buenos Aires, interromperam mais de 60h de acorrentamento voluntário e greve de fome nas escadas da Corte Suprema de Justiça, há poucas quadras do Obelisco, em mais uma tentativa desesperada de se fazerem ouvidos.
Na capital, há mais de dez dias em vigília em frente aos Tribunais de Buenos Aires, o grupo denuncia torturas, prisões ilegais e perseguições políticas contra docentes e comunidades originárias que protestam contra a reforma constitucional. O acorrentamento e greve de fome só foram interrompidos após o Ministério dos Direitos Humanos do país e atual presidente da nação, Alberto Fernandéz, propor uma mesa de diálogo.
Como mostrou reportagem do Brasil de Fato, o terrorismo de Estado na província de Jujuy, o assassinato de um militante social em um protesto e repressões ilegais são uma amostra da política de Estado dos governos de direta que podem vir na Argentina.
Apesar desses avisos, a extrema-direita vence nas eleições parciais nesse último domingo com 33% dos votos para Milei. O futuro é incerto no país vizinho, que tem respirado ares do Brasil de 2018.
Edição: Elis Almeida