Minas Gerais

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Artigo | Rondonistas e rodoanel: manifestações populares fazem parte do aprendizado

Manifestantes protestam contra o rodoanel - Foto: Reprodução
Estudantes construíram diagnóstico social e ambiental de bairro ameaçado

O Projeto Rondon Minas, atuando com o voluntariado universitário por 18 anos, desenvolveu uma metodologia de trabalho comunitário que prima pelo diagnóstico e planejamento coletivo nas comunidades e pela realização de ações socioeducativas. O intuito é formar e informar os cidadãos e incentivar o protagonismo social e político das pessoas nos locais onde atuamos.

Trabalhando com equipes multidisciplinares, os universitários podem colocar o conhecimento científico de diversas áreas do conhecimento à serviço do desenvolvimento das comunidades. O estudante da área de saúde pode fazer palestras informativas sobre doenças e tratamento, envelhecimento, vida saudável, nutrição, primeiros socorros, por exemplo. Estudantes das áreas humanas e sociais podem atuar com oficinas para os jovens, para pessoas com deficiência, para grupos de economia solidária, formação de professores, empreendedorismo entre outras atividades.

Mas, o diferencial da ação é aquilo que os jovens universitários aprendem nessa relação. As trocas de saberes do conhecimento científico e dos saberes populares são potentes e colocam novos desafios e reflexões aos universitários.

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O contato dos rondonistas com a realidade das pessoas, muitas vezes difícil e vulnerável, faz pensar em como as diversas profissões podem atuar para solucionar as questões sociais, econômicas e culturais do país. As conversas com os moradores das comunidades trazem as vivências das dinâmicas familiares e comunitárias, problemas e potencialidades locais de todas as ordens.

Vida política

Uma das experiências mais interessantes para os rondonistas é participarem da vida política das comunidades como mobilizações, reuniões de associações de moradores, movimentos de reivindicação de melhorias nos bairros, encontros com líderes comunitários e lideranças indígenas e quilombolas.

Exemplo dessa vivência é o trabalho do Projeto Rondon Minas realizado junto à comunidade Nascentes Imperiais no município de Contagem. A população está passando por um processo de luta por moradias e regularização do bairro. Está ameaçada de desapropriação pelas obras do Rodoanel proposta pelo Governo do Estado de Minas Gerais. Na área de impacto da obra estão instaladas cerca de 570 a 600 edificações (concluídas ou em construção).

Os moradores enfrentam uma luta social e ambiental para garantir os direitos das famílias residentes no território e a preservação ambiental através da manutenção de várias nascentes de água, localizada nas residências dos moradores, e que alimentam a represa Várzea das Flores.

Nascentes Imperiais possui cerca de 40 ruas e becos sendo apenas a via principal Rua Ipê Amarelo asfaltada. O restante se constitui de acesso por terra e sem saneamento adequado. O bairro não é regularizado e as famílias não possuem o título de propriedade dos imóveis.

O bairro Nascentes Imperiais nasceu do movimento de duas ocupações urbanas. Por essa condição, a maioria das residências não possuem água, esgoto e luz com redes apropriadas e públicas. Nas casas predominam as fossas e instalações improvisadas e compartilhadas entre os vizinhos. Estima-se que a população atual seja de 3 mil moradores.

Rodoanel

A proposta do Governo de Minas é readequar o sistema viário da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), transferindo o transporte de cargas para a nova via – RODOANEL - que terá 100 quilômetros e duas faixas por sentido. O projeto apresenta o traçado sob 11 municípios, dentre eles Contagem, atingindo, fortemente, o bairro Nascentes Imperiais.

Os municípios atingidos diretamente na região metropolitana de Belo Horizonte são: Betim, Contagem, Ibirité, Nova Lima, Pedro Leopoldo, Ribeirão das Neves, Sabará, Santa Luzia, São José da Lapa, Vespasiano e Belo Horizonte.

Comissão Nascentes Imperiais

Os rondonistas atuaram, junto com a Comissão Nascentes Imperiais, composta de moradores do bairro, para resistir, de forma organizada, contra a destruição do território.

A ação conjunta realizou um diagnóstico social e ambiental através da aplicação de questionários em 375 moradias e comércios e de ações de mobilização dos moradores para discussão da situação e informação sobre o avanço do projeto de obras e o direito humano à moradia digna.

Segundo Valdir Pontes, representante da Comissão de Moradores a parceria com o Projeto Rondon foi importante porque o Governo do Estado de MG dizia que o traçado atingiria poucos moradores e não tínhamos como argumentar essa determinação. Com o diagnóstico e a mobilização realizada com os rondonistas foi possível verificar o número de nascentes no território e levantar exatamente o número de moradias que seriam atingidas diretamente.

Mobilização

Os rondonistas participaram de uma mobilização realizada em 7 de agosto de 2022 quando os moradores organizaram uma marcha entre a comunidade e a represa Várzea das Flores. Participaram da mobilização autoridades políticas (vereadores, deputados), entidades sindicais que apoiam o movimento, entidades sociais da região, o Projeto Rondon Minas e grupos culturais como Boi Rosado, que organiza apresentações teatrais e ações socioculturais que denunciam fatos políticos e violações de direitos em nosso Estado.

Segundo Valdir, essas ações concretas no bairro e as manifestações já atingiram algumas vitórias como o início do processo de regularização fundiária do bairro pela prefeitura e um certo recuo do governo para negociar uma mudança do traçado do Rodoanel. “Mas as lutas ainda não terminaram porque precisamos defender as nascentes de água, algumas residências e a própria represa Várzea das Flores que ainda será afetada pelo projeto da rodovia”, afirma.   

Em 2023, a manifestação acontece novamente, no mês de agosto, na comunidade para reforçar as denúncias contra o projeto do Rodoanel que não condiz com o projeto de desenvolvimento social e ambiental que queremos para as nossas cidades.

E sabe onde os universitários rondonistas estarão? Presentes e aprendendo em todas essas manifestações populares!

 

Monica Abranches é presidente da Associação do Projeto Rondon de Minas Gerais e vice-presidente do Instituto Projeto Rondon Nacional

Valdir Carlos Pontes é representante da Comissão de Moradores Nascentes Imperiais

Luzia Cláudia Novaes é representante da Comissão de Moradores Nascentes Imperiais

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Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

Edição: Elis Almeida