Como se atreve? – rosnou, com ar de rainha do século XV
Eu estava esperando o elevador no térreo de um prédio desses em que grã-fino mora. Estava até cantarolando o hino nacional. Estava de boa. Era um dia sem notícias esdrúxulas no Brasil. Coisa rara, né?
De repente, sai do elevador uma dessas grã-finas sem qualquer noção da realidade do mundo. Ela parece que vive em um eterno desfile na Sapucaí.
Ela ostentava um chapéu maior que um pneu de caminhão, multicolorido. Nada contra. Até porque não sou crítico de arte de chapéu de grã-fina. E um cachorrinho na mão.
Ela voltou-se pra mim com uma cara enfurecida, enquanto levantava seu chapéu e exibia suas feições compradas naqueles médicos que prometem milagres. O tempo fechou na porta daquele elevador.
- Como se atreve? – rosnou, com ar de rainha do século XV.
- Se atreve o quê, minha senhora?
- O elevador de serviço é do outro lado. Não é aqui.
- Aos gritos, ordenou que eu me retirasse. Começou a xingar o porteiro.
- Calma, minha senhora.
- Calma o quê? Serviçais não usam esse elevador. Sai daqui seu lixo.
- Minha senhora, não se trata ninguém assim.
A confusão ficou generalizada. A porta do elevador já estava um furdunço só.
Alguém sensato retirou a grã-fina e a levou para o canto. Acho que ele deu a real pra ela. Ela voltou toda humilde e pedindo desculpas.
Ela descobriu que eu era o dono do seu apartamento e mais da metade do prédio. O detalhe importante é que ela estava devendo um ano de condomínio e quatro meses de aluguel.
Ela pediu um milhão de desculpas.
- Eu confundi você com o menino que sempre traz remédios e comida pra mim.
Era melhor ela ter ficado calada.
Rubinho Giaquinto é músico, escritor e militante do Coletivo Solidariedade Cidadã.
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Edição: Elis Almeida