Saneamento para todos só virá com empresas públicas
A Lei Nacional de Saneamento (11.445/2007) foi alterada em 2020 para facilitar a privatização de empresas e serviços públicos de saneamento. Com o objetivo de se ajustar a nova lei, o então governador do Piauí, Wellington Dias, atual ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), apresentou um projeto de lei à Assembleia Legislativa do Piauí em 2021.
Para garantir a participação e o debate, a Secretaria de Planejamento (Seplan) do governo realizou audiências públicas presenciais e virtuais; contratou a renomada Fundação para Pesquisa e Desenvolvimento da Administração, Contabilidade e Economia (Fundace) da Universidade de São Paulo (USP); e realizou uma consulta pública que ficou aberta de 18 de fevereiro de 2022 a 4 de março de 2022. Mostrando assim, uma preocupação em ouvir todos os envolvidos e interessados sobre a temática, cujas contribuições serviriam de subsídios para a tomada de decisões.
No dia 4 de março de 2022 foi realizado pelo governo do Piauí, pelo Instituto de Águas e Esgotos e pela Seplan um workshop sobre a regionalização e a Política de Saneamento Básico que discutiu o anteprojeto de lei complementar proposto pelo governo. Sobre o evento, Rejane Tavares, secretária de Planejamento do Piauí, disse:
“Estamos trabalhando no marco regulatório do saneamento básico, baseado na Lei Federal 14.026/2020, que afirma que todos os estados precisam fazer sua adaptação. Essa lei prevê uma proposta de regionalização da gestão do sistema de abastecimento de água e de esgoto, e nós trouxemos experiências da Paraíba e do Paraná para poder nos ajudar a identificar qual o melhor modelo para o estado, para beneficiar todos os municípios, fazendo com que chegue serviços de qualidade”.
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Após todos esses expedientes chegou-se à Lei Complementar 262/2022 que instituiu a Microrregião de Águas e Esgotos do Piauí (MRAE) e sua respectiva estrutura de governança.
A regionalização dos serviços de saneamento, cujo órgão de governança a ser criado, tem função de atuar na uniformização do planejamento, da regulação e da fiscalização, será o instrumento necessário para garantir a continuidade da prestação de serviços pela Agespisa, que é um patrimônio público do povo do Piauí.
Para universalizar, não pode privatizar
Somos conhecedores dos desafios para que alcancemos a universalização do acesso aos serviços no estado, mas também temos convicção de que o caminho da privatização tende a aumentar a exclusão daqueles que não tem acesso aos serviços por viverem em áreas que não são atrativas ao capital privado.
A universalização tão almejada por todos não coaduna com privatização. Pelo contrário, o governo do Piauí deve atuar para fortalecer a Agespisa, para garantir instrumentos de participação e controle social, garantir projetos com qualidade que qualifiquem a empresa a buscar recursos do PAC para investimentos, deve ainda garantir que os municípios, titulares dos serviços, tenha voz e voto no órgão de governança que será instituído na microrregião.
Dessa forma, não temos dúvidas, alcançaremos a universalização, garantindo saneamento para todo o povo do Piauí, priorizando o setor púbico e dando destaque à prestação regionalizada, para alcançar as metas previstas na Lei 14.026/2020.
Nesse aspecto, os autores Satoko Kishimoto, Lavinia Steinfort e Petitjean Olivier ressaltam que “empresas estatais diferem das empresas privadas na medida em que, devem tomar decisões orientadas pelo interesse coletivo e não apenas por critérios econômico-financeiros. É possível gerir empresas estatais de forma eficiente, sob a perspectiva do interesse público. Diferentes tipos de gestão no setor público, com controle social, possibilitam reduzir acentuadamente problemas relacionados à corrupção e à apropriação indevida por interesses privados”.
Notadamente, o peso da máquina pública ajuda o gestor político a tomar decisões que levem em conta o interesse da coletividade. As metas impostas pelo ordenamento do saneamento, são um grande desafio que se apresentam. Mas, com apoio dos órgãos de fiscalização e controle, das companhias que acumularam durante décadas experiências e tem expertise na área, o gestor público sensível à causa pode e dever chegar aos resultados satisfatórios.
Não devemos nos iludir pelas narrativas e discursos de ganho de eficiência dos capitalistas que querem a lógica do lucro em detrimento do interesse social, público e coletivo.
“A privatização assume muitas formas e nomes disfarçados, incluindo parcerias público-privadas (PPPs), iniciativas financeiras privadas, terceirização, corporatização, ‘direito de escolha’, concorrência forçada e liberalização do mercado. Embora a privatização tenha sido impulsionada, por mais de três décadas, com base em sua suposta ‘eficiência’, inúmeros estudos revelaram que poucas evidências existem para apoiar essa opção política ao invés da propriedade pública. O que eles descobriram, ao invés disso, são aumentos de custos e redução da qualidade para os usuários dos serviços, piora das condições para os trabalhadores e praticamente inexistência de prestação de contas, transparência e controle democrático”, afirmam Satoko Kishimoto, Lavinia Steinfort e Petitjean Olivier.
Futuro do saneamento no Piauí deverá ser público pautado pela propriedade pública de acessibilidade para todos, com garantia de serviços públicos de qualidade para os munícipes do nosso estado.
Defender o serviço público é sinônimo de cidadania, soberania e equidade. Desejamos um estado em que todos possam ter o acesso pleno à água e ao saneamento, em especial aqueles que vivem em vulnerabilidade social. Desse modo contribuiremos para um estado e um país mais justo e menos desigual.
Aurélio Ferreira é pedagogo, mestrando em educação profissional e tecnológica e dirigente do Sindicato dos Urbanitários do Piauí (STIU-PI).
Edson Aparecido da Silva é sociólogo, mestre em planejamento e gestão do território, secretário executivo do Ondas e assessor de saneamento da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU).
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Leia outros artigos da coluna Saneamento é Básico no Brasil de Fato MG.
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Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Larissa Costa