Para ser um bom professor, o principal é ter boa formação
A sala de aula não é um ambiente trivial. A escola, como parte de uma sociedade, é complexa. Diante disso, ser professora atualmente, diferente do que divulgam as narrativas romantizadas, constitui um enorme desafio, e, como me disse um amigo, também professor, é fácil cair na mediocridade.
Após um percurso de quase duas décadas de magistério, contribuindo com a formação de alguns milhares de jovens e adultos, no ensino fundamental II, médio e algumas vezes no superior e na pós-graduação, e obtendo retornos positivos deles, posso afirmar que me considero um bom professor. Soma-se a isso minha experiência com formação de professores e a constância nos estudos, que me ofertam elementos para avaliar com mais consistência e criticidade meu próprio trabalho.
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Nos últimos anos, também tenho sido interpelado por professores em início de carreira, que perguntam: como você faz? Seja em relação à disciplina, às avaliações, aos estudos, aos métodos de ensino, enfim, à práxis docente. E esse é o principal fator que me motivou à escrita deste texto. Seguem, assim, cinco sugestões básicas para ser um bom professor.
1. Compreensão dos conteúdos lecionados
Para ser um bom professor, a principal condicionante é ter boa formação e seguir sempre estudando. Afinal, como repetia uma querida ex-professora: ninguém dá o que não tem.
É necessário reservar tempo e energia para leitura, escrita, participação em cursos, seminários, congressos, dentre outros. Dessa forma, os educadores estudantes compreendem com mais profundidade os conteúdos lecionados e os procedimentos pedagógicos. A exponencial ampliação da circulação de informações, não tira do professor o lugar de referência em relação aos conhecimentos compartilhados em sala de aula.
O professor que entende de fato do que está falando, consegue com mais facilidade o respeito e admiração dos estudantes. Já vivi diversas situações em que determinados estudantes desinteressados, que não tinham afinidade com os temas em análise, ou mesmo com os estudos de forma geral, não se comportavam de forma indisciplinada nas aulas porque compreendiam que à frente deles estava um professor que se dedicava ao entendimento dos conteúdos.
2. Não reproduzir pessimismos
Infelizmente, o pessimismo entre os professores é recorrente. As lamentações envolvem o comportamento dos estudantes, as determinações das gestões, a negligência das famílias, os salários defasados, o excesso de trabalho e por aí vai. Essas queixas revelam problemas reais. As reivindicações por melhorias na educação são justas.
A questão é que as reclamações excessivas, dia após dia, resultam em pessimismo exacerbado que não ajuda, que pode gerar resignação e descomprometimento dos profissionais da educação, sob a justificativa de que tudo vai mal. Essa situação é rumo certo para uma descida desgovernada ladeira abaixo.
Lembro de ter convivido com professores que passei a chamar de final de filme (ou spoiler, na linguagem dos jovens de hoje), que na primeira oportunidade diziam: quando você chegar na minha idade, na minha fase, com tantos anos de carreira, vai ver... etc, etc, etc. Curiosamente, observei jovens professores dizendo coisas semelhantes. O ambiente escolar tende a ficar insuportável diante do reino do pessimismo.
3. Organizar as atividades cotidianas
Um bom professor, definitivamente, precisa ser uma pessoa e um profissional organizado. Se um professor tem como marca o constante improviso, o esquecimento, o sufoco, as ausências, será muito difícil conseguir exercer suas funções com maestria.
É preciso ter horários definidos para o trabalho na escola e para as outras empreitadas da vida. Isso envolve considerar que o professor precisa também se organizar para outras atividades, como de lazer, estudos e engajamento social. Sim, é importante que professores tenham engajamento social, especialmente pela própria educação. Esse tipo de dedicação permite aos professores compreenderem melhor a realidade, os trâmites institucionais e inclusive incorporarem valores contribuintes com a coletividade.
Para facilitar, ferramentas como agendas, cronogramas e planners ajudam muito. Certa vez propus a uma turma de ensino médio alterar a data de entrega de trabalhos diante do compromisso duvidoso de parte dos estudantes. Um grupo de alunas dedicadas imediatamente reagiu. Elas disseram que um ponto positivo das minhas aulas era a organização e manutenção dos prazos. Revi minha proposta. Elas estavam certas.
Adequações são necessárias, mas não para mal remediar irresponsabilidades. É preciso ressaltar ainda que essa organização libera os professores para exercerem plenamente suas funções educativas. O tempo de aula deve ser valorizado ao máximo. Aula não é momento de resolver outras pendências, do próprio trabalho ou pessoais. Em outras palavras: não findar em amadorismo.
4. Desenvolver uma postura de autoridade
É imprescindível ter autoridade em sala de aula. Isso evidentemente passa pelos outros tópicos: conhecimento, esperança, organização. Contudo, tem uma questão de postura que necessita ser enfatizada. O professor precisa ser paciente e respeitoso, e, ao mesmo tempo, firme e objetivo. Precisa tomar cuidado com as palavras, comunicar bem, até com os gestos e as vestimentas. Ter e demonstrar segurança garante uma presença do professor em sala de aula que afirma sua autoridade.
Essa autoridade tem de ser reconhecida pelos estudantes, por toda equipe e por aqueles que vierem a adentrar a escola. Aulas não devem ser interrompidas. Intervenções externas indevidas não são aceitáveis. Certa vez, diante de dias agitados em uma escola em que trabalhava, tive que afixar um aviso na porta da minha sala alertando para não ser interrompido, o aviso valia também para a diretoria. Afinal, os estudantes não vão reconhecer a autoridade do professor se perceberem que outros membros da equipe a desconsideram.
Não custa lembrar que exercer a autoridade não quer dizer dar abertura para atitudes autoritárias.
5. Manter relacionamento saudável com os estudantes
A atividade do profissional em educação deve buscar ainda um relacionamento saudável com os educandos. Com relacionamento saudável, ou agradável, quero dizer um convívio pautado na democracia e na escuta.
Não seria exagero dizer que todos os outros fatores elencados são insuficientes, para uma boa atuação, se não houver um convívio decente entre professores e estudantes. E também não se trata de querer ser o queridinho dos educandos. Já observei colegas se perderem por isso, tornarem-se reféns da aceitação, em detrimento do conhecimento, da educação. Ou seja, uma falsificação do trabalho docente.
Exemplo disso são professores que dissimulam e mascaram resultados para que sejam homenageados como patronos ou paraninfos de formandos. É importante ter um relacionamento baseado no respeito e na confiança, e não estar em uma constante competição por popularidade.
Obviamente, cada professor vai construindo suas estratégias, não há fórmulas cerradas, cometo erros e sigo aprendendo, mas certos princípios e ações são fundamentais. Negligenciar qualquer um desses pontos explicitados significa um entrave para quem deseja ser um bom professor, de uma boa professora.
Cleiton Donizete Corrêa Tereza é professor de História nas redes municipal e estadual em Poços de Caldas, especialista em História Contemporânea (PUC Minas), especialista em Planejamento, Implementação e Gestão de Educação a Distância (UFF), mestre e doutor em Ciências Humanas (Diversitas-FFLCH-USP), integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas em Administração Escolar (GEPAE-USP), membro do Coletivo Educação de Poços de Caldas e da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
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Leia outros artigos na coluna Cidades das letras: Literatura e Educação no Brasil de Fato MG
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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Elis Almeida