Autonomia é fundamental para que pesquisas não fiquem refém de interesses privados
No fim de outubro, assistimos a mais um ato autoritário do Governo de Minas, mostrando sua falta de compromisso e o desrespeito com o povo mineiro.
No dia 26 do mês passado, o governador baixou um decreto alterando as regras para a escolha da gestão da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), uma instituição histórica e um dos mais importantes pilares da educação e de fomento da produção científica de ponta em Minas Gerais.
Conforme o decreto, a presidência do Conselho Curador da agência passa a ser exercida por servidor da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (Sede), acumulada às suas funções na própria Secretaria. Além disso, o presidente e o diretor de Ciência, Tecnologia e Inovação da Fapemig passam a ser indicados diretamente pelo governador, deixando de cumprir mandato fixo.
Por fim, o Conselho Curador perderá também a função original, de deliberar sobre o manual da agência, sobre o plano de ação, e sobre o orçamento anual. Em outras palavras, o principal órgão de pesquisa mineiro perde sua autonomia e passa a ser gerido por pessoas externas ao corpo docente e externa à comunidade científica, indicadas por Romeu Zema.
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Já sabemos que o governador não conhece e não se importa com Minas Gerais, e que sua política só visa a privilegiar seus amigos e financiadores de sua campanha. Então não há dúvidas de que essa manobra autoritária está vinculada ao interesse de Zema em tirar a gestão da Fapemig das mãos do corpo docente da instituição, e da comunidade científica mineira, que historicamente indica, em lista tríplice, os nomes para gerir a principal agência estatal de financiamento da pesquisa desenvolvida em nosso estado.
É mais um passo na estratégia de desmonte das instituições públicas autônomas, que refletem a falta de compromisso do governo com os direitos dos mineiros e mineiras à saúde, à educação, ao emprego pleno e a qualquer iniciativa estatal que vise promover bem-estar e dignidade. No limite, é um ataque à democracia.
A autonomia da Fapemig, assim como a autonomia universitária e de todas as instituições de ensino e de produção de conhecimento, é parte fundamental para assegurar que o financiamento e o desenvolvimento das pesquisas feitas com dinheiro público estejam a serviço do povo mineiro, e não refém de interesses privados ou eleitoreiros. Essa concepção é parte fundamental de uma perspectiva democrática e socialmente referenciada da produção científica e do conhecimento.
Não é a primeira vez que vemos esse tipo de iniciativa. Ao buscar retirar a autonomia da Fapemig e controlar seus gestores, Zema segue reproduzindo a lógica da extrema direita, que visa o desmonte e aparelhamento das nossas instituições estatais, que na nossa opinião devem seguir sua função histórica de trabalhar pelo conjunto dos interesses da sociedade, pelo bem público e coletivos.
Universidades, fundações estaduais de fomento à pesquisa, trabalhadores e a comunidade científica vêm protestando contra a decisão, apontando seu teor autoritário e centralizador. Também em repúdio, os reitores e reitoras associados ao Fórum das Instituições Públicas de Ensino Superior do Estado de Minas Gerais (Foripes) e a Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG) publicaram notas à comunidade política e científica contra o decreto. Em coro, eu e a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT-MG) entramos, por meio de nossos mandatos, com uma representação no Ministério Público denunciando esta intervenção política de Zema na Fapemig.
Não vamos permitir que o governador continue atacando a educação e a pesquisa no nosso estado, e a própria democracia brasileira.
Ana Pimentel é deputada federal pelo PT-MG. É médica defensora do SUS, docente no Departamento de Medicina da Universidade Federal de São João del Rei e pesquisadora da saúde coletiva.
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Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.
Edição: Elis Almeida