Um relatório elaborado pelo Projeto Manuelzão, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), pelo Instituto Guaicuy e pelo Instituto Diadorim detalhou a relevância socioambiental da bacia do Córrego Bom Jesus, situada em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Ambientalistas denunciam que a área está ameaçada por um projeto da construtora Direcional, que quer implantar 18 prédios na localidade.
Segundo o documento, a região é fundamental para o sistema de drenagem sem impermeabilização do solo. Portanto, permitir que seja ocupado envolve pensar em obras futuras de reparação, pois utilizar tais áreas envolve riscos para o próprio empreendimento.
Maria Antonieta Pereira, presidenta da Associação de Defesa da Natureza da Região do Nacional (Ecovida), explica que esse sistema garante que a água da chuva penetre na terra. Do contrário, segundo ela, o volume pode aumentar e causar alagamento.
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“São as enchentes evitáveis, as mortes anunciadas de pessoas e animais. Os prédios sobre nascentes vivem úmidos, encharcados, mofados. Podem apodrecer e desabar”, alerta.
O relatório reafirma que o problema condena a cidade e o seu entorno a problemas ecossistêmicos. “Associados ao cenário de emergência climática, podem trazer sérias consequências, como o assoreamento do córrego e diminuição da vazão de uma bacia que contribui para a saúde de um patrimônio Cultural da Humanidade e trazendo consequências na vida das pessoas e na economia da RMBH”, descreve.
O texto também define o córrego como uma área úmida, ou seja, um ecossistema no qual a água é o principal fator que controla o ambiente e a biodiversidade. Neste sentido, a construção também afetaria o desempenho crucial que a bacia tem na recarga dos lençóis freáticos.
O que diz a legislação?
Em 2021, a Prefeitura de Contagem considerou que o Córrego faz parte de uma “Área de Proteção Permanente (APP) do curso d’água e de nascentes”. No entanto, a empresa encomendou um estudo geotécnico, que apontou para a existência de argila e gnaisse ao fundo. Assim, o ambiente foi considerado uma vala de acumulação de água e não teria a necessidade, portanto, de ser protegida pela legislação.
Na época, o subsecretário de controle ambiental de Contagem, Geraldo Vitor, apontou que o documento foi considerado consistente pela equipe técnica da Secretaria de Meio Ambiente (Semad). O alvará para construção foi concedido no dia 17 de fevereiro de 2023.
No parecer jurídico, também presente no relatório de relevância socioambiental, instituições apontam que zonas úmidas, veredas e nascentes difusas são regiões que precisam ser conservadas pois possuem especificidades hidrogeomorfológicas. Ou seja, são identificadas como solos encharcados.
Neste sentido, o texto aponta que a legislação vigente no Brasil enquadra o córrego como Área de Proteção Permanente (APP) e que, por isso, a zona de proteção do entorno dessas espécies é de 50 metros. A análise observa ainda que é perceptível a proximidade do empreendimento com a área de vegetação rasteira e área alagada.
“Nesta região, segundo relatos e registros dos moradores, há afloramento de água durante todo o ano, se caracterizando como uma área constituída por nascentes difusas, agregada a olhos d’água, possuindo, assim, uma área de preservação permanente. Além de uma readequação da caracterização do território pelo poder público fiscalizador, o empreendimento deverá reavaliar sua planta construtiva de expansão, não somente se adequando ao que é descrito no Novo Plano Diretor do município de Contagem, como ampliando suas medidas corretivas e de compensação, pelo substancial impacto paisagístico e ambiental na Bacia Hidrográfica do Córrego Bom Jesus”, reforça o relatório.
Abaixo-assinado
Um abaixo-assinado promovido por associações, coletivos e movimentos populares e ambientais foi aberto para denunciar possíveis irregularidades na construção do complexo residencial.
Com mais de 400 assinaturas, o documento requisita à Prefeitura de Contagem e ao Ministério Público o embargo da obra, além de pedir pela revisão do projeto para respeitar a localidade.
Outro lado
Procurada pela reportagem, a construtora Direcional informou que a obra é regularizada e passou por um longo processo de licenciamento. Além disso, afirmou que possui as devidas licenças, como o alvará de construção e documentos necessários emitidos pela Prefeitura Municipal de Contagem.
A empresa também reforçou que trabalha dentro das normas técnicas e ambientais exigidas e não faz qualquer intervenção na APP do Córrego Bom Jesus.
Edição: Elis Almeida