Minas Gerais

Coluna

Marielle, o direito à moradia e o programa Casa Minha, de Contagem

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Imagem Ilustrativa - Foto: Governo Federal
Luta de Marielle Franco se confunde com a luta por moradia

O povo brasileiro amanheceu na manhã do dia 24 de março com uma boa notícia: após seis anos angustiantes, os suspeitos de serem os mandantes do assassinato de Marielle Franco foram presos. Os irmãos Brazão – chefes da milícia da Zona Oeste do Rio de Janeiro - e Rivaldo Barbosa – ex-chefe da Divisão de Homicídios do Rio de Janeiro- foram autuados como arquitetos deste crime brutal, que demonstra o papel de uma máfia capaz de controlar as instituições do estado.

Segundo a delação de Ronnie Lessa e as provas colhidas, o crime teve como motivo principal o fato de Marielle Franco denunciar as irregularidades promovidas pelos Brazão em regiões de domínio da milícia que os apoiava, em especial na região de Rio das Pedras. Conforme exposto no relatório da Polícia Federal:

[...] no contexto da presente apuração, dar-se-á especial atenção a outro aspecto igualmente controverso e marcante na história da Família Brazão, qual seja: as imputações sobre invasão e “grilagem” de terras, atividade intrínseca à atuação das milícias em geral, o que repercute especialmente de forma clara na atividade parlamentar de Chiquinho Brazão na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, pautada por legislações questionáveis acerca de questões fundiárias e favorecimento a ocupações irregulares, tendo ele, inclusive, ocupado a Presidência da Comissão de Assuntos Urbanos da Casa durante seus mandatos como Vereador. (Polícia Federal, 2024).

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Portanto, a luta de Marielle Franco se confunde com um dos principais problemas do povo no cotidiano das cidades brasileiras:  a luta pelo acesso à terra, à moradia e à propriedade. Ao se opor àqueles que se intitulavam donos de uma comunidade, Marielle enfrentou a elite política carioca vinculada à máfia, que garantia o seu poder por meio das milícias e decidia sobre quem poderia ou não ter moradia na região.

Retomando o fio da história

Como a história nos mostra, Marielle não foi a única liderança na luta pelo direito à terra e à moradia no Rio de Janeiro. Se olharmos para trás, veremos que o governador Leonel Brizola teve um papel central na luta por reforma urbana e regularização fundiária naquele estado, sendo um expoente do campo progressista, democrático e popular na realização dessa luta.

Leonel Brizola, em seu governo no Estado do Rio de Janeiro (1983-1986), buscou transformar significativamente a abordagem em relação à questão habitacional, especialmente para as populações de favelas. O Programa Cada Família Um Lote buscava a distribuição de um milhão de títulos de propriedade. Apesar do objetivo ambicioso, o programa não alcançou suas metas previstas, entregando uma quantidade bem menor de títulos. Especificamente para a população das favelas da capital do Rio de Janeiro foram 13.604 títulos entregues.

Martins Junior (2021) argumenta que, apesar das críticas ao Programa Cada Família Um Lote, as políticas de Brizola representaram um marco na relação do governo estadual com os movimentos populares, especialmente as associações de moradores.

Este alinhamento com as demandas populares, especialmente por meio da FAMERJ, sinaliza uma política pública de habitação que tentou se distanciar das práticas remocionistas anteriores, priorizando a urbanização e regularização de favelas. Esta foi uma tentativa importante de mitigar a vulnerabilidade social, particularmente nas zonas norte e oeste do Rio de Janeiro, áreas marcadas por maior segregação.

Caso a política de reforma urbana implementada por Brizola tivesse avançado e se tornado uma política do estado do Rio de Janeiro, teríamos um cenário bem diferente do que temos hoje, onde as oligarquias mafiosas controlam territórios e favelas, criando um poder paralelo e impedindo o Estado brasileiro a acessar tais regiões, carentes de infraestrutura e serviços públicos.

Realidade esta que permitiu o silenciamento brutal de Marielle Franco e interrompeu a continuidade da sua luta por moradia e direito à cidade.

Marília e o Casa Minha: a manutenção do fio da história

Assim como Brizola fez no passado, Marília hoje também enfrenta a especulação imobiliária e luta pela reforma urbana na cidade de Contagem. Ao anunciar o Programa Casa Minha, que beneficiará cerca de 60 mil contagenses, nossa prefeita cria laços ainda mais profundos com a população da cidade, ao garantir o acesso justo à moradia para as maiorias mais empobrecidas da cidade.

A regularização fundiária possibilita que o poder público possa entrar naquele território, garantindo a centralização da prestação de serviços, sem deixar que grupos milicianos possam adentrar esses territórios, coagindo as comunidades a pagarem tributos paralelos para terem acesso a serviços básicos nessas localidades.

Além disso, essa política garante dignidade às pessoas que vivem nessas comunidades, propiciando a elas, o sentimento de pertencimento à cidade, fortalecendo laços comunitários e colaborando para o desenvolvimento da cidadania nesses territórios.

Uma política robusta de moradia como o Casa Minha, fortalece a luta pela reforma urbana e pelo direito à cidade não somente para aqueles que tem posses e podem pagar, mas para as camadas populares que vivem do suor do seu trabalho.

Considerações finais

Por vezes, valorizamos pouco o que temos ao nosso lado. Olhamos a grama do vizinho e achamos que ela é mais verde que a nossa. Temos a tendência de diminuir ou desvalorizar aquilo que tem sido feito por nossas próprias lideranças.

O que temos feito em Contagem está diretamente ligado a um grande legado do campo nacional, popular e democrático em nosso país, que busca garantir direitos sociais e avançar na qualidade de vida dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiras.

O programa “Casa Minha” do Governo Marília é a continuidade da luta de uma tradição nacional-popular, que tem Brizola como referência inaugural. Mas não somente ele. Lula e Dilma também fazem parte dessa construção, ao promoverem o Minha Casa, Minha Vida. Além de inúmeros lutadores e lutadoras em defesa da moradia e da reforma urbana nas mais diversas localidades do Brasil e suas periferias urbanas, como Marielle Franco.

Portanto, é preciso ressaltar a importância e o quão acertada é a política promovida pela prefeitura de Contagem. Na medida em que Contagem implementa as políticas de regularização fundiária e infraestrutura, ficamos cada vez mais distantes das milícias, do poder paralelo e avançamos na luta fundamental pelo direito de todos à cidade.



Adriana Souza é professora de História, ativista socioambiental do SOS Vargem das Flores, co-fundadora do Coletivo Com Elas e assessora do Gabinete da Prefeita Marília Campos em Contagem.

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Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

Edição: Elis Almeida