Em Belo Horizonte, cerca de 7.326 árvores foram suprimidas apenas em 2023, segundo dados da prefeitura. No mesmo ano, o Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden) do governo federal apontou que a cidade foi a capital que mais esquentou no Brasil, com registros de 4,2ºC acima da média.
Embora o El Niño tenha sido apontado como principal causador da anomalia, a ambientalista Jeanine Oliveira, integrante do Projeto Manuelzão, vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), acredita que a falta de prioridade da pauta ambiental da gestão do município também pode contribuir para mudanças climáticas.
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“Quando você retira as áreas verdes, as árvores, sem fazer um manejo adequado, você já tem o clima, a umidade e a temperatura modificadas”, explica.
Além disso, ela afirma que as supressões atrapalham o fluxo genético da biodiversidade, com a interrupção do trânsito da fauna, fazendo com que muitos animais fiquem ilhados em bolhas verdes na cidade.
A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) informou que, além das mais de 7 mil árvores derrubadas, outras 36.739 foram podadas, em uma ação contínua e preventiva, para evitar danos e desastres no período chuvoso.
Transparência
Para impedir que mais árvores sejam suprimidas sem aviso prévio, os vereadores Wagner Ferreira (PV), Bruno Pedralva (PT), Cida Falabella (Psol), Iza Lourença (Psol) e Pedro Patrus (PT) apresentaram à Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) o PL 870/2024.
O texto, que recebeu parecer favorável da Comissão de Legislação e Justiça e inicia a tramitação em 1º turno, determina a publicação prévia da autorização ou licença ambiental com justificativas técnicas para que os cortes sejam realizados, com sete dias de antecedência.
“Poderemos mapear onde estão sendo feitos os cortes e, se estiverem em desacordo com a legislação vigente, nós, parlamentares, e também os movimentos organizados e sociedade civil, poderemos incidir para evitar ações que degradem os biomas e a paisagem da nossa cidade”, diz a coautora do projeto, Cida Falabella.
Atualmente, o corte de árvores na cidade é feito pela Secretaria de Obras e Infraestrutura, por meio da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), e não pela Secretaria de Meio Ambiente (SMMA). O que para Jeanine Oliveira é um erro. Segundo ela, desde que a responsabilidade foi transferida à Sudecap, há menos vigilância sobre o motivo dos cortes, bem como uma terceirização do serviço.
Para o vereador Bruno Pedralva, além da importância da transparência, é preciso que a cidade cumpra a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) de ter uma árvore para cada habitante em um plano de dez anos.
“Para que a gente possa realmente criar uma cidade que seja exemplar do ponto de vista de cuidado com sua população e com seu meio ambiente”, afirma.
Arborização e desigualdade social
Um estudo recente da Universidade Estadual Paulista (Unesp) apontou que a distribuição de árvores na estrutura viária de BH diminui em regiões que vivem populações mais pobres. Esse fenômeno é chamado pelos pesquisadores de “efeito de luxo”, no qual regiões da cidade que abrigam famílias de baixa renda tendem a receber menor investimento em arborização e infraestrutura verde.
“Em Belo Horizonte, essa é uma questão que está, inclusive, na origem da nossa cidade. BH foi construída para ser a "Paris brasileira", uma cidade arborizada e com ruas largas, a ‘cidade jardim’. Esse plano higienista ignorava, propositadamente, a cidade que crescia para além da Avenida do Contorno”, analisa Cida Falabella.
Para ela, a partir da invisibilização e da segregação, a capital cresceu vendo o racismo operar nas regiões mais afastadas do centro, sobretudo nas regiões Norte, no Barreiro e em Venda Nova, que têm os menores índices de arborização e que sofrem historicamente com enchentes e outros problemas ambientais.
“Temos que monitorar e seguir cobrando, para que a Prefeitura faça mais plantios nessas regionais e que dê a manutenção adequada às mudas. E também cuidar para que as regiões mais arborizadas não percam essa característica, com o avanço da especulação imobiliária na cidade”, destaca a parlamentar.
Outro lado
O Brasil de Fato MG entrou em contato com a Prefeitura de BH para comentar o conteúdo dessa reportagem, mas até o momento de sua publicação, não obteve resposta. O espaço segue aberto para manifestações.
Edição: Leonardo Fernandes