Há quase dez anos, a Ocupação Zezéu Ribeiro e Norma Lúcia, que fica no coração da região Central da capital mineira, é a casa de aproximadamente 300 pessoas. No último mês, as 88 famílias que residem no prédio, que já abrigou o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e ficou abandonado por décadas, receberam a notícia de que, enfim, terão suas moradias definitivas.
Com a retomada do programa Minha Casa Minha Vida do governo federal, o prédio de oito andares será reformado e receberá 88 apartamentos estruturados para ser o lar das famílias.
“É histórico para Belo Horizonte nós conquistarmos moradias populares no hipercentro. Nossa cidade nunca teve isso, pobre morando no hipercentro. São famílias que vivem aqui há nove anos em estilo acampamento. Imagina quando elas receberem a chave de um apartamento todo pronto. A cidade é para todos e não para alguns. Por que a empregada doméstica não pode morar na mesma região que sua patroa?”, comemora Maria Eliseth, da coordenação do Movimento Nacional de Luta Pela Moradia (MNLM), uma das entidades que atua na gestão da ocupação.
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Ainda não existe previsão de data para o início das obras. Durante o período de reformas, os moradores receberão auxílio-moradia e serão realocados em imóveis alugados. Passada essa etapa, as famílias receberão as chaves de seus apartamentos, como explica Maria Eucir, conhecida como “Pequetita”, e uma das coordenadoras da ocupação.
“Nossos projetos já foram aprovados. Estamos esperando a contratação dos técnicos para iniciarem a reforma, transformando um prédio que era comercial em moradia digna. Essa conquista é muito maravilhosa. Nós vamos poder proporcionar esse direito para as pessoas que estão aqui, que vieram de vilas e favelas”, explica.
Conquista é fruto da mobilização coletiva
Ao longo dos quase dez anos de ocupação, as famílias precisaram enfrentar muitas barreiras e dificuldades. Entre elas, a do preconceito de uma população que não está acostumada a conviver com pessoas em situação de maior vulnerabilidade econômica morando na região central da cidade.
“No começo, foi difícil, porque viam a gente como favelado. Hoje, eles aceitam a gente numa boa, porque conseguimos mostrar que nós somos favelados, mas também somos dignos de morar no centro da cidade. Assim como eles são trabalhadores, nós, que morávamos na favela, também somos”, relata Jackson Pereira da Costa, que faz parte do movimento popular de moradia desde a década de 80.
Porém, a trajetória da ocupação também é marcada pela solidariedade. Para a estruturação do espaço, os moradores contaram com doações, apoio financeiro e a retaguarda de um conjunto de parceiros políticos.
“Nós tivemos muita ajuda, recebemos doações de alimentos. Quando nós entramos no prédio, nós fizemos uma cozinha coletiva na parte de baixo, que tinha almoço e janta. Saíamos pedindo nos supermercados verduras e alimentos. Assim, nós conseguimos passar o período mais difícil. Nós tivemos várias mãos que nos ajudaram e a compreensão do povo, dos comerciantes, que nos acolheram”, relembra Daniel dos Santos, diretor da Confederação Nacional das Associações de Moradores (Conam), entidade que também atua na ocupação.
Jaqueline Margarete Silva é ex-jogadora de futebol e uma das moradoras que espera ansiosamente pelo apartamento. Ela destaca que a conquista não teria sido possível sem a determinação coletiva dos moradores.
“Nós somos uma união e essa conquista é fruto do trabalho coletivo. Isso foi com muita luta e muita garra, que a casa realmente vai sair na marra. Se não fosse o trabalho e o empenho, nós não estaríamos aqui”, comenta.
Íris de Souza Almeida, que também é uma das coordenadoras da ocupação e militante da Central de Movimentos Populares (CMP) e da União Nacional por Moradia Popular, reforça que, para essa população que vive à margem do acesso à direitos, a dignidade só pode ser conquistada a partir da luta.
“Eu senti na pele a falta de moradia e sei que a maioria, às vezes até mais do que eu, também sente. Gente que tem filhos, que é mãe solo, por exemplo. É por meio da luta que se consegue alguma coisa. Isso para mim não tem preço. Às vezes eu penso em parar, mas está no meu sangue querer lutar”, ressalta.
Edição: Leonardo Fernandes