Classe política não aprendeu com as inundações do Rio das Velhas
No dia 22 de abril de 2024 foi protocolado na Câmara Municipal de Santa Luzia, o Projeto de Lei (PL) Nº 038, de iniciativa do Poder Executivo, que estabelece normas e condicionantes para a ocupação de terrenos em áreas suscetíveis a inundação na cidade. O projeto também altera e acrescenta dispositivos na Lei Nº 4.622, de 21 de setembro de 2023, que dispõe sobre a regularização de edificações em Santa Luzia.
Dois dias após o referido protocolo, o PL se tornou a Lei Nº 4.716/2024, sancionada pelo Prefeito Luiz Sérgio Ferreira Costa (PSD).
Chama a atenção a celeridade do tramite de um projeto de lei que vai gerar grandes impactos socioambientais e urbanísticos em vários pontos alagáveis de Santa Luzia.
Ainda mais no atual contexto de tragédia climática que deixou a maior parte das cidades do Rio Grande do Sul, debaixo d’água. O projeto foi criado na sexta feira, dia 19 de abril, protocolado dia 22 de abril e sancionado na quarta feira dia 24 de abril. Ou seja, não se passou uma semana desde a criação do PL e a sanção da Lei.
Quem está acostumado com os processos parlamentares sabe que um PL passa por apreciação e votação nas Comissões Permanentes da Câmara Municipal, como por exemplo a Comissão de Constituição e Justiça, além de discussão e votação em dois turnos pelo Plenário da Câmara, em prazo legal. Há a possibilidade, em caso de urgência, de quebra de interstício, situações em que a proposta é votada apenas uma vez.
Porém, em caso de projetos de lei polêmicos é preciso haver tempo e participação popular nas discussões e tomada de decisão, o que não houve.
Chama a atenção também o fato de o Poder Executivo propor e sancionar mais uma lei urbanística para a cidade antes da sanção do novo Plano Diretor municipal, que está sendo revisado desde 2021.
Isso porque a solução dos graves problemas urbanísticos da cidade não depende simplesmente da criação de leis avulsas, como foi feito, por exemplo, em relação ao tema do Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo. Mas sim da construção de uma política pública urbanística municipal que consiga integrar o Plano Diretor, a Regularização Fundiária e demais políticas públicas ambientais, sociais, culturais e econômicas.
Centro histórico e bairros as margens do Rio das Velhas em risco
A celeridade para a sanção da lei de ocupação de terrenos em áreas suscetíveis a inundação em Santa Luzia representa mais um avanço para a construção, dentre outros loteamentos, do Cidade Jardim, que ameaça a destruição da Fazenda Vicente Araújo e impõe impactos irreversíveis para o Centro Histórico e para os vários bairros as margens do Rio das Velhas. Bairros que, praticamente todos os meses de dezembro e janeiro, ficam debaixo d’água em decorrência das históricas enchentes no Rio das Velhas.
Ademais, a classe política luizense ainda não aprendeu com o próprio mito de origem de uma cidade que nasceu as margens do rio e que teve que ser transferida para o alto da colina do atual Centro Histórico devido as enchentes.
Também não aprendeu com as inundações dos últimos anos que deixou tantos luzienses desabrigados. E por fim, não aprendeu com o exemplo trágico das atuais inundações no estado do Rio Grande do Sul.
Depois da tragédia anunciada, não resolverá dizer que a culpa é da natureza e colocar a solução na conta de Deus.
Glaucon Durães é doutorando em Ciências Sociais pela PUC MG, Conselheiro Municipal do Patrimônio Cultural de Santa Luzia e integrante do Movimento Salve Santa Luzia
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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
Edição: Elis Almeida