Minas Gerais

Coluna

Mães de pessoas LGBTQIAPN+: uma luta por liberdade e políticas públicas

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Foto: Mães pela Liberdade/Divulgação - Coletivo mães pela liberdade em Juiz de Fora
Famílias que divergem do padrão são marginalizadas

Em colaboração com Edwiges Lempp

 

O dia das mães é tradicionalmente celebrado no segundo domingo do mês de maio. Em 2024, dia 12 de maio foi a data de estarmos juntas, mães e filhas, tias, avós, com as mães do coração e com as mães na memória, para quem não as tem mais em vida.

Embora tenhamos uma data que celebra as mães, podemos nos perguntar: “qual dia não é dia das mães?” Isso porque sabemos que ser mãe, maternar, cuidar e arregaçar as mangas em defesa de nossas filhas, filhos e filhes não é tarefa simples. É exercício cotidiano, árduo e, ao mesmo tempo, gratificante. A maternidade representa uma mudança na vida de uma mãe, de uma família.
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Assim como a sociedade é diversa, também são diversas as experiências de maternar. Neste texto propomos uma reflexão da realidade vivenciada pelas mães de filhas, filhos e filhes LGBTQIAPN+. Você sabia que Minas Gerais possui um coletivo que congrega mães e pais de pessoas LGBTQIAPN+? O Mães pela Liberdade MG é uma associação sem fins lucrativos que busca acolher e fortalecer mães e pais que buscam uma vida digna para suas filhas/os/es.

A existência de coletivos como o “Mães pela Liberdade”, o “Mães pela Diversidade” e outros nasce da necessidade cotidiana de diálogo e de proteção às pessoas LGBT+ e de suas famílias. Em pleno século XXI habitamos uma sociedade conservadora e violenta, onde predominam valores heteronormativos e patriarcais.

Para muitos, ainda prevalece a visão de mundo que associa as mulheres à função social de progenitora. Inserida nos moldes de uma família tradicional, cabe a esta mulher o papel de transmitir valores, assim como recai sobre ela a responsabilidade por qualquer “desvio” de seus filhos em relação aos padrões estabelecidos.

Famílias diversas e mulheres que venham a divergir deste padrão são então marginalizadas, discriminadas e tidas como ameaça aos valores éticos e morais que configuram a “família de bem”.

Ódio e preconceito dividem sociedade

Nesse contexto, ser mãe de filhes LGBTQIAPN+ não é tarefa fácil. Com o aprofundamento do conservadorismo vivenciado no Brasil e no mundo nos últimos anos, essa tarefa tornou-se ainda mais complexa, haja vista que o ódio, o preconceito e a intolerância dividiram a sociedade brasileira. Vimos uma pauta moral, fundada em valores retrógrados e excludentes da diversidade, alcançar todos os espaços sociais, tirando a vida, a liberdade e os sonhos das pessoas LGBTQIAPN+. Segundo o Observatório de Mortes e Violências de LBTI+ no Brasil, em 2023 houve um assassinato de pessoa LGBT+ a cada 38 horas.

É nesse sentido, que além de acolher e apoiar nossos filhos, conforme a sua orientação sexual ou identidade de gênero, as mães pela liberdade enfrentam e lutam contra o preconceito e a LGBTfobia, lutam por direitos, por políticas públicas que assegurem a existência digna, lutam pela criação de espaços de acolhimento e de cuidados com a saúde física e mental, entre outros.

Nossa preocupação é com a segurança de nosses filhes, principalmente em razão do aprofundamento do preconceito e da banalização da violência, incentivados inclusive por atitudes de ocupantes de posições de poder, pelas fake news e por outras frentes e medidas que tentam legitimar e justificar as violências.

Ainda que muito venha sendo feito, ainda que os coletivos estejam se ampliando, a ação das mães é limitada. É preciso ter políticas públicas que considerem e respeitem a diversidade em todas as suas formas de manifestação e que assegurem aos nosses filhes o direito à vida e ao acesso a estas políticas, sem discriminação.

Combate à discriminação e políticas públicas

Há, no plano nacional, políticas públicas que visam proteger e garantir direitos para a população LGBT+. O principal espaço de discussão e acompanhamento de tais políticas é o Conselho Nacional de Combate a Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. O mesmo Ministério passou a contar, a partir de 2023, com uma Secretaria Nacional dedicada à população LGBT+. Sammy Larrat, responsável pela pasta, é uma liderança do movimento trans no Brasil e foi coordenadora do Programa Transcidadania, implementado na gestão de Fernando Haddad, quando prefeito de São Paulo.

Uma das áreas mais sensíveis para a população LGBT+ é a saúde. Nota-se que nos centros de saúde, que são a porta de entrada para o SUS, têm sido apontado com um dos principais problemas enfrentados pelas mães que buscam atendimento para seus filhes, principalmente para aqueles que precisam de acompanhamento permanente, de hormonização e outros.

Desde 2011 o Brasil possui uma Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, sob a responsabilidade do Ministério da Saúde, que visa adequar os equipamentos e serviços de saúde às necessidades do segmento, de modo a eliminar preconceitos e discriminações.

A luta das pessoas LGBT+ em Belo Horizonte tem história e já rendeu frutos importantes em termos de políticas públicas. Desde 2018, BH possui um centro de referência das pessoas LGBT+, localizado na região central. Porém, como vimos no episódio de fevereiro deste ano, as políticas para a diversidade não são prioridade para a atual prefeitura. A execução da Política Nacional de Saúde da População LGBT+ em Belo Horizonte encontra-se em estado crítico, haja vista que há baixa ou nenhuma implementação de suas diretrizes e ações nas estruturas do SUS da cidade.

Sabemos que BH precisa, pode e merece ter políticas públicas de cuidado, de acolhimento, de formação e qualificação para pessoas LGBTQIAPN+. Para tanto, o diálogo é essencial, seja para a compreensão dos problemas que atingem as pessoas e suas famílias, seja para traçar o caminho da liberdade e da dignidade na diversidade.

 

Edwiges Lempp (Hedy) é administradora e consultora organizacional, mãe de filha trans, integra o Coletivo Mães pela Liberdade MG, entidade constituída de mães e pais de filhes LGBTQIAPN+, no qual atua como coordenadora do Eixo de Políticas Públicas e Direitos Humanos.

Luiza Dulci é economista e doutora em sociologia. Constrói o Movimento Bem Viver MG e integra a rede de jovens economistas "Desajuste – Economia Fora da Curva".

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Leia outros artigos de Luiza Dulci em sua coluna no Brasil de Fato MG

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Este é um artigo de opinião. A visão das autoras não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Edição: Elis Almeida