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Rejeição da MP 1227: "o estado é nosso", ruge a elite patrimonialista

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Charge - Vitort
Estado funciona enriquecendo uma minoria às custas da maioria

As críticas e a rejeição da medida provisória 1227/2024 demonstram a força do patrimonialismo no Brasil. A mídia comercial e o Congresso atuaram, em sua maior parte, para manter privilégios patrimonialistas.

Patrimonialismo foi um termo cunhado pelo sociólogo alemão Max Weber, e usado, mais tarde, no Brasil, por Raymundo Faoro, entre outros, para descrever uma relação em que a elite usa o Estado a seu favor.

O Estado funciona, na prática, para empoderar e enriquecer uma minoria, às custas da maioria.

Como? De várias maneiras.

Uma das mais importantes é no campo tributário. Um sistema tributário injusto, que alivia o grande patrimônio e o grande capital e que distribui generosos privilégios tributários. Privilégios que ocorrem quando o governo deixa de cobrar de grandes empresas os impostos que deveriam pagar. São as chamadas isenções, que elas compensariam investindo e criando empregos - as tais contrapartidas, que na prática nem sempre ocorrem.

O governo dará R$ 550 bilhões de isenções tributárias em 2024. Não são para você, cidadã ou cidadão comum, que paga seu Imposto de Renda suado na declaração anual ou, mesmo que não declare Imposto de Renda, paga tributo embutido em quase tudo que compra. São para grandes empresas.

Destes R$ 550 bilhões, segundo a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco), cerca de R$ 300 bilhões têm compensações, por parte das empresas, nulas ou insuficientes.

Entenderam porque não tem dinheiro para investimentos sociais (o termo é esse, "investimento", e não "gasto", já que o retorno, não apenas social, mas mesmo econômico, é certo), ou para recomposição salarial dos professores universitários e de outros servidores públicos?

Mas para isenções tributárias sem contrapartidas tem. Também tem para os juros da dívida pública - este sim, um verdadeiro "gasto", sem qualquer retorno para o país ou a população.

A MP 1224 queria por um freio nessa farra das isenções tributárias. A mídia apelidou-a "MP do fim do mundo" - seria o fim do mundo, sim, mas para setores que deixam de pagar tributos e oferecem pouco ou nada em troca.

Lula e Haddad foram derrotados pelo Congresso e pela mídia.

Sim, não é só no Congresso que Lula está em desvantagem. Na mídia também, sempre esteve, e fez e faz pouco ou nada para reverter essa situação. Não aprendeu com os erros passados.

O Estado brasileiro sempre foi basicamente patrimonialista. Um Estado Hood Robin - Robin Hood ao contrário, que tira dos pobres para dar aos ricos.

Após a Constituição de 1988, e especialmente nos governos petistas, o patrimonialismo, se infelizmente não morreu, passou a dividir espaço com o Estado Social. É o que Lula queria dizer quando falava que, no seu governo, "os pobres tinham entrado no orçamento público". E era verdade - embora os ricos tenham continuado lá também.

O golpe de 2016, a emenda constitucional do teto de gastos públicos, a reforma trabalhista, a eleição de Bolsonaro, a ocupação do Banco Central por um bolsonarista representante do rentismo, tudo isso tem o sentido de uma volta, plena, do Estado patrimonialista.

É nossa elite rugindo: "o Estado brasileiro é somente nosso! Não dividimos com ninguém!"

Rubens Goyatá Campante é doutor em Direito pela UFMG e pesquisador do Centro de Estudos Republicanos Brasileiros (CERBRAS)

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Leia outros artigos de Rubens Goyatá Campante em sua coluna no Brasil de Fato MG

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Este é um artigo de opinião, a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

Edição: Elis Almeida