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“A boca fala do que o coração está cheio”: falamos de memória, justiça e defesa de direitos

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Falamos de memória, justiça e defesa de direitos

Uma passagem bíblica ensina que a boca fala do que o coração está cheio. O versículo Mateus 12:34 quer dizer que verbalizamos o que já tomou nossos sentimentos, muitas vezes sem que a gente perceba o quanto determinado tema nos mobiliza. 

E foi o que presenciei na quarta-feira (19), no plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), durante a argumentação de deputados da extrema direita, que conseguiram derrubar o quórum para não votar uma proposta da minha colega de partido e do Bloco Democracia e Luta, a deputada estadual Andreia de Jesus (PT).

O projeto de lei (PL) 1160/2009 institui a Semana Estadual das Vítimas da Violência do Estado, a ser realizada anualmente, entre os dias 12 e 19 de maio. 

No entanto, a extrema direita, usando dos métodos que lhe são convencionais, fez uma associação mentirosa entre o campo progressista e o crime organizado, e está espalhando essa mentira nas redes sociais, associando a data à onda de atentados do Primeiro Comando da Capital. 

Estamos no parlamento, e o que se espera é que haja divergência de ideias, mas que minimamente se baseie em posições ancoradas na verdade. No entanto, o que se vê é que os deputados conservadores, ao invés de assumir as próprias motivações, disseminam a inverdade.

É dever do Estado criar as leis e resguardar para que elas sejam cumpridas

É importante colocarmos por terra a mentira construída para confundir as pessoas e impedir que elas façam uma reflexão fundamental para melhorarmos a vida de todos e, sobretudo, fazer justiça. 

Não podemos nos calar diante das violências cometidas pelo Estado, porque, se assim o fizermos, estaremos contribuindo para uma sociedade sem parâmetros, sem norma legal. Em outras palavras, quando o Estado comete violência contra os cidadãos estamos abrindo mão da moderação da lei, estamos abrindo mão da própria democracia. 

É dever do Estado criar as leis e resguardar para que elas sejam cumpridas, não podendo ser o próprio Estado quem vai descumpri-las. Portanto, quando os agentes do Estado cometem violência contra os cidadãos, estão desrespeitando a Constituição Federal de 1988. 

Maio é mês de sensibilizar a sociedade quanto às violações de direitos

Quem comete algum crime deve pagar pelo o que cometeu, sendo a pena resultado de um processo legal e não meramente a decisão de um agente público. Se abrirmos precedentes para a justiça ser feita com as próprias mãos, mergulharemos na barbárie.

Memória, justiça e defesa de direitos

Maio foi escolhido para a apresentação do PL da deputada por ser o mês em que ocorreu uma das mais sangrentas chacinas no Brasil, quando cerca de 500 pessoas foram mortas em São Paulo. No ano de 2006, em apenas nove dias, entre 12 e 21 de maio, policiais com ou sem farda executaram quase 500 pessoas e desapareceram com outras tantas na Baixada Santista.

Esse massacre ficou conhecido como os “Crimes de Maio”.  Ao fazer uma associação mentirosa sobre a data, os deputados de extrema direita, inclusive desconsideram que a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou, em 2013, a Lei 14.981, que estabelece o 12 de maio como o “Dia das Mães de Maio”

Apesar de toda a brutalidade dos agentes do Estado, o procedimento investigatório criminal foi arquivado pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de São Paulo.

O mês de maio foi instituído como data para sensibilizar a sociedade quanto às violações de direitos sofridas por vítimas de violência institucional. A data foi proposta pela Rede Mães de Luta,  mobilização que envolve  25 coletivos e entidades que lutam por justiça por seus filhos assassinados brutalmente pelo Estado. 

É dever de toda a sociedade jogar luz sobre momentos nefastos, como essa chacina, e fazer o exercício de memória. Lembrar para que nunca se repita. Se a boca fala do que o coração está cheio, nós, deputadas do PT, falamos de memória, justiça e defesa de direitos. É disso que nosso coração está cheio.

 

Macaé Evaristo é deputada estadual pelo Partido dos Trabalhadores.

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Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Edição: Ana Carolina Vasconcelos