Câmara Municipal de BH é uma das mais conservadoras do país
No mundo inteiro, está em curso uma batalha da extrema direita contra os direitos reprodutivos de meninas, mulheres e pessoas que gestam, em especial ao acesso a mecanismos de aborto. No Brasil, onde o procedimento sempre foi criminalizado, eles querem destruir o aborto legal, permitido em casos de estupro, de risco de vida para a mãe e de anencefalia do feto. Felizmente, fruto da mobilização do movimento feminista, o PL 1904/24, que equiparava aborto a crime de homicídio, foi retirado de pauta na Câmara dos Deputados, ainda que não tenha sido arquivado.
Porém, nos municípios, a extrema direita segue atuando para impor alterações legislativas e a precarização da rede de atendimento às vítimas de estupro. Foi o que ocorreu com a aprovação da Lei 11.693/2024 em Belo Horizonte, que dificulta, por meio da intimidação, o acesso ao aborto legal, obrigando a prefeitura a publicar no Diário Oficial do Município todos os procedimentos realizados na cidade.
Os especialistas em saúde sabem que o DataSUS já é um sistema completo, onde todos esses dados podem ser acessados para elaboração de políticas públicas. Não se trata de transparência, portanto. O debate aqui é outro. O que a extrema direita quer é fazer uma disputa política com a vida dessas meninas, submetendo vítimas de violência sexual a novas e contínuas violências, com a exposição e a interpelação judicial de seus direitos.
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Em Porto Alegre, vereadores apresentaram um projeto com o objetivo de obrigar a vitima de estupro a ouvir os batimentos cardíacos do feto antes da realização do abortamento legal. Em São Paulo, a Câmara vetou um pedido de reabertura dos serviços de aborto legal em um dos hospitais do município. Como se vê, há um ataque coordenado contra uma importante conquista das mulheres, prevista na legislação brasileira desde 1940.
A Câmara Municipal de Belo Horizonte é uma das mais conservadoras do país, com 23 vereadores (56,09%) que apoiam a agenda de extrema direita. Nesta casa parlamentar, apesar de haver diversos partidos, há extrema sub-representação do povo trabalhador e das maiorias sociais. Numa cidade de maioria negra (52,38%) e feminina (53,12%), a Câmara Municipal tem apenas 12% de parlamentares negros e 21% de mulheres. A distorção é relevante porque mostra a distância entre os representantes eleitos em 2020 e o povo pobre e periférico.
De acordo com dados do último Anuário Brasileiro de Segurança Pública, ocorre um estupro a cada seis minutos no país, desses, 61,6% vitimam meninas de até 13 anos, mais da metade são negras e a grande maioria são vitimas de familiares ou conhecidos.
Por isso, quando o objetivo é restringir o acesso ao aborto legal, trata-se, sim, de penalizar majoritariamente meninas negras, a ponta mais vulnerável desta equação. O país todo viu o que ocorreu com a menina de Goiás, uma criança que foi estuprada e, mesmo assim, foi impedida judicialmente de exercer seu direito ao aborto legal por 12 semanas.
No dia 25 de julho, dia das mulheres negras e latino-americanas, conseguimos uma liminar que determina a suspensão total da aplicação da Lei da Gravidez Infantil de BH (11.693/24). Foi uma vitória importante em consonância com a Ação Direta de Inconstitucionalidade movida pelo Psol no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ MG).
Certamente, o tema dos direitos reprodutivos das mulheres e sua defesa será pautado na disputa eleitoral que se aproxima. Felizmente, as vitórias que as mulheres tiveram nacionalmente contra o PL 1904, e agora em nossa cidade, contra a lei 11.693/24, nos colocam com mais força para enfrentarmos o debate. A extrema-direita belorizontina tem que saber que o movimento feminista está a postos para frear qualquer retrocesso contra nossos direitos!
Iza Lourença é vereadora em BH pelo PSOL.
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Leia outros artigos de Iza Lourença em sua coluna no Brasil de Fato MG.
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Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.
Edição: Elis Almeida