Autonomia do Banco Central é domínio do capital financeiro
Por Weslley Cantelmo
No dia 29 de julho, durante visita à sede do Banco Central, em São Paulo, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), aproveitou para entregar a Medalha da Inconfidência a Roberto Campos Neto, presidente do banco público. Foi um pequeno festejo ancap contra o Brasil.
A medalha, uma homenagem criada na década de 1950 pelo governo mineiro Juscelino Kubitschek, como forma de homenagear aquelas personalidades que contribuem para o desenvolvimento de Minas Gerais e do país, hoje é frequentemente profanada, pelo espírito do governador, destruidor do futuro.
Minas Gerais é um dos estados que, desde a implantação do modelo de gestão neoliberal, entre 1990 e início dos anos 2000, mais tem sofrido com o processo de desindustrialização, com fortes perdas de empregos e maior dependência com relação a atividades primário-exportadoras. O que sequer traz resultado fiscal satisfatório, devido aos efeitos da Lei Kandir. Trágica dinâmica que está intimamente vinculada à manutenção de taxas de juros estratosféricas.
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Não é de hoje que se mantém elevadas taxas de juros no Brasil, mas, nos últimos anos, desde a derrubada golpista de Dilma Roussef, acentuou-se os mecanismos de domínio do capital financeiro, com a aprovação da autonomia administrativa do Banco Central. Amalucada regra, que faz com que o presidente indicado por um governo, bem como mais da metade da diretoria do banco, permaneça como autoridade monetária até a metade do governo seguinte. Foi claramente uma vacina a possíveis governos progressistas.
E para estrear esse modelo esdrúxulo, nada pior (para nós e o Brasil) que um economista medíocre, ex-funcionário do Santander e comprometido militante da extrema direita.
Campos Neto, em maio de 2024, em evento internacional, por sua conta e risco, sinalizou ao mercado que o movimento de redução da taxa de juros que se efetivava deveria ser desacelerado. Manifestação essa, que foi uma surpresa para os demais membros do Comitê de Política Monetária, que, até então, na comunicação oficial do BC, mantinha um discurso favorável à manutenção da trajetória de queda na taxa de juros.
Esse movimento de Campos Neto levou a críticas públicas feitas por um dos diretores do banco, Paulo Piccheti. Nessa mesma época, foi noticiado o encontro de Campos Neto com o governador bolsonarista de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), na casa de Luciano Huck.
Poucos dias depois, Campos Neto sinaliza a Tarcísio de Freitas que aceitaria ser seu eventual Ministro da Fazenda. Esse conjunto de fatores funcionou como uma sinalização, um apito de cachorro ao mercado, para um movimento de pressão pela manutenção da taxa de juros em patamares elevados. A justificativa é que seria um remédio contra o risco fiscal decorrente dos gastos do governo federal com importantes política públicas.
Esse é o sujeito homenageado Zema. Surpresa? Nenhuma. São homens feitos da mesma matéria-prima. Aquela do Brasil arcaico, dependente, que exclui o povo e suas demandas civilizatórias. São os que mantém o país frágil economicamente no cenário global, e ganham muito dinheiro com essa mediocridade.
Weslley Cantelmo é doutor em economia pelo Cedeplar/UFMG, Conselheiro do Conselho Regional de Economia (CORECON-MG) e presidente do Instituto Economias e Planejamento
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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal
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Edição: Elis Almeida