Minas Gerais

IRREGULARIDADES

Populações atingidas denunciam violações cometidas por mineradoras em cidades mineiras

Ameaças, agressões e descaso com a saúde são algumas das denúncias

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
Foto: Henrique Chendes - ALMG

Moradores de São Joaquim de Bicas, Brumadinho, Ouro Preto, Mariana, Conceição do Mato Dentro e comunidades do Vale do Jequitinhonha e do Norte de Minas denunciam ameaças e agressões relacionadas à atividade minerária. As denúncias foram apresentadas durante uma audiência pública da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada na terça-feira (20). O encontro foi solicitado pelos deputados petistas Leninha, Doutor Jean Freire e Leleco Pimentel.

Frei Rodrigo Péret, da Rede Igrejas e Mineração, descreveu a situação como uma “arquitetura de impunidade” em torno do setor minerário. Ele criticou os acordos de reparação firmados após os rompimentos de barragens em Brumadinho e Mariana, alegando que esses acordos acabam revitimizando os atingidos. 

“Esses acordos colocam a empresa dentro do território, controlando a cena do crime”, afirmou Péret.

Valéria Carneiro, liderança do Assentamento Pastorinhas, em Brumadinho, reforçou as críticas ao modelo de reparação adotado pela Vale. Segundo ela, o rompimento da barragem permitiu à mineradora expandir sua presença em territórios estratégicos. 

"A reparação é muito mais danosa do que o crime em si. O crime tem dia e hora para terminar. A reparação abre o nosso território para a mineração”, denunciou. 

Valéria acredita que se estabeleceu uma “indústria da reparação”.

Impactos na saúde da população

Moradores também relataram graves impactos na saúde, especialmente doenças de pele e respiratórias, após a entrada das mineradoras nas áreas atingidas. Simone da Silva, da comunidade quilombola de Gesteira, em Barra Longa, relatou que sua filha desenvolveu sintomas alérgicos relacionados à lama deixada pelo desastre. “Nossas crianças estão contaminadas e adoecidas”, afirmou.

Henrique de Oliveira, da Aldeia Naôxohã, em Paraopeba, compartilhou experiência semelhante. 

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“Meu filho de 3 anos tem o corpo todo marcado por feridas. Quando o levamos para os médicos da Vale, dizem que é só uma coceira sem relação com a contaminação”, relatou.

A situação na comunidade Piauí Poço Dantas, em Itinga, também foi mencionada. Djalma Gonçalves, do Povo Aranã Caboclo, relatou problemas respiratórios provocados pela extração de lítio e pela poeira que paira na região.

Perseguições e ameaças

Cláudia Saraiva, liderança da comunidade Ponte das Almorreimas, em Brumadinho, denunciou perseguições por parte da Vale após sua casa ser desapropriada para a construção de uma estação de captação de água. 

“Fui perseguida por denunciar as injustiças da Vale”, contou. 

Ela também denunciou a infiltração de pessoas pelas mineradoras dentro das comunidades para vigiar e intimidar os opositores da mineração. 

“Fui coagida no meu emprego e abandonei 32 anos de concurso público para que eu pudesse viver”, relatou.

O cacique William de Souza, da etnia Pataxó, em São Joaquim de Bicas, corroborou o relato de coerção: “Eles entram dentro da comunidade e colocam os parentes uns contra os outros”. 

Ele enfrenta um processo judicial aberto pela Vale por tentar impedir a construção de uma estrada em seu território.

Carlos José da Silva, cacique da Aldeia Arapowã Kakya Xucuru Kariri, em Brumadinho, denunciou a intimidação por parte da mineradora. 

“A mineradora nos intimidou com caçambas de barro e mais de 30 jagunços impedindo o acesso à comunidade”, relatou. 

Segundo ele, a Vale alega ser dona do território, mas a comunidade continua resistindo.

Críticas ao sistema judiciário

Matheus Leite, advogado da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais (Ngolo), criticou a atuação das instituições de justiça brasileiras, apontando que elas mantêm uma relação próxima com as mineradoras, o que perpetua a impunidade. 

“É uma vergonha, mas os atingidos precisam buscar justiça nos tribunais internacionais. Nós não podemos contar com o Poder Judiciário que existe no país”, declarou.

Jonas Vaz Leandro Leal, servidor do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), ressaltou a importância de levar as denúncias ao conhecimento dos promotores locais. Ele também destacou a existência de mecanismos internos no MPMG, como a Ouvidoria, que pode ser acionada quando a promotoria não atua de forma adequada.

Ao fim da audiência, o deputado Leleco Pimentel (PL) anunciou que a comissão encaminhará requerimentos, entre eles, um pedido de proteção para todas as pessoas que participaram da reunião em função das denúncias feitas.

Com informações da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.

Edição: Ana Carolina Vasconcelos