Moradores do Quilombo Família Sanhudo, localizado na comunidade de Tejuco, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), denunciam sofrer violações de direitos por parte de mineradoras. O tema foi pautado em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na última segunda-feira (26).
Evandro de Paula, integrante do quilombo, denunciou as atividades da mineradora Vale. Segundo ele, uma obra realizada pela empresa em 2020 contaminou o sistema hídrico local com lama remanescente do rompimento da barragem de Córrego do Feijão, ocorrido em 2019.
“As mineradoras rodearam a comunidade e a gente vive praticamente em um deserto. Foi feito um levantamento, exames e estudos pela Fiocruz, que mostraram que 99% da comunidade está contaminada com metal pesado", afirmou o atingido durante a reunião, que foi solicitada pela deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL).
O Quilombo Família Sanhudo possui 300 anos de história e foi certificado pela Fundação Cultural Palmares em abril deste ano, que reconheceu a comunidade como descendente de população negra escravizada.
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Essa certificação poderia ser um marco para a garantia da proteção da comunidade contra invasões, uso indevido de recursos naturais, desmatamento e despejo. No entanto, os moradores relatam que seus direitos não têm sido respeitados.
O procurador Edmundo Dias Netto Júnior, do Ministério Público Federal (MPF), visitou o território em maio e classificou a situação como desoladora, destacando a violação de direitos humanos. Para ele, as mineradoras estão praticamente expulsando os quilombolas.
"A permanência deles ali exige da comunidade um processo de resiliência e de resistência enorme, tamanha é a sanha de expulsão que esse conjunto de mineradoras está cometendo contra a comunidade, com efeitos até no abastecimento de água", alertou o procurador.
A deputada Bella Gonçalves (PSOL) sugeriu a revisão do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre a Vale e a comunidade, enfatizando a necessidade de ouvir os quilombolas.
"Está muito evidente que o modelo de reparação da comunidade, que teve seus reservatórios contaminados por minério de ferro pela Vale, precisa ser feito consultando a comunidade. A comunidade quer que as nascentes sejam requalificadas, que o sistema de abastecimento seja comunitário", afirmou a parlamentar.
Certificação fortalece direitos
De acordo com a Fundação Cultural Palmares (FCP), a certificação é um importante ato administrativo e representa o primeiro passo na consolidação dos direitos das comunidades quilombolas em seus territórios. Esse reconhecimento não só amplia a visibilidade dessas comunidades, mas também reforça sua luta por justiça e igualdade.
Instituída pelo Decreto Federal 4.887, de 2003, a certificação deve ser conduzida de maneira respeitosa e inclusiva. Esse processo reconhece oficialmente as comunidades que se identificam como quilombolas e oferece oportunidade para que reafirmem sua identidade, território, história e direitos.
O outro lado
A Vale esclarece que, em dezembro de 2020, ocorreu um incidente de deposição de sedimentos, proveniente de atividade de manutenção de via pela empresa, e que não guarda relação com atividades minerárias.
Desde então, a mineradora fornece água potável, por caminhões-pipa, aos reservatórios comunitários que, por sua vez, distribuem a água por meio da rede preexistente.
Com relação à comunidade quilombola Família Sanhudo, a Vale mantém diálogo aberto para receber as demandas e fazer as devidas apurações sobre os atendimentos realizados.
Com informações da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Edição: Ana Carolina Vasconcelos