Minas Gerais

OPINIÃO

Artigo | Vereadores cassados por fraudar cota de candidaturas femininas voltam à disputa em 2024

A penalização mais severa da fraude, a declaração de inelegibilidade, só atingiu as mulheres

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) - Foto: Guilherme Dardanhan

Em 2020, após as eleições municipais, o PSOL Minas e o PSOL BH, por suas representantes presidentas à época, Maria da Consolação e Katia Sales respectivamente, entraram com ações na justiça eleitoral por descumprimento da legislação em relação à cota de mulheres nas chapas proporcionais dos partidos PRTB e do PROS.

O art. 10, § 3º, da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97) estabelece que, nas eleições proporcionais, cada partido deve apresentar no mínimo 30% e no máximo 70% de candidaturas para cada gênero. A fraude às cotas consiste na apresentação de candidaturas fictícias, mulheres sem intenção ou chances de eleição, que somente estão na lista para atender ao aspecto formal e numérico da regra.

No final de 2023, o Tribunal Superior Eleitoral reconheceu a fraude na ação contra o PRTB, e no início de 2024, a partir do recurso do Ministério Público Eleitoral, na ação contra o PROS.  Entendeu-se que as candidatas das chapas só foram registradas pelos partidos para observar a cota de gênero, sem a intenção real de disputar o cargo.

Os julgamentos determinaram:

•          a cassação de todos os candidatos vinculados ao Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) do Diretório Municipal do PRTB e do PROS na capital mineira;

•          a declaração de inelegibilidade das mulheres cujos dados foram utilizados para lançar candidaturas falsas com o objetivo de burlar a lei;

•          a nulidade dos votos obtidos pelas chapas proporcionais, com o recálculo dos votos dos quocientes eleitoral e partidário;

•          o cumprimento imediato da decisão, independentemente de publicação do acórdão.

Com isso, os então vereadores eleitos pelo PROS César Gordin e Wesley Moreira, bem como o vereador pelo PRTB Uner Augusto, perderam o mandato. No entanto, os três retornam como candidatos à vereança de Belo Horizonte em 2024.

Homens impunes

Chama a atenção e exige reflexão, que a penalização mais severa da fraude, a declaração de inelegibilidade, só atinja as mulheres usadas como candidatas fictícias, enquanto os homens, dirigentes e candidatos, que também praticaram o ilícito eleitoral e usufruíram de grande parte do mandato, permanecem com todos os seus direitos políticos intactos, se candidatando novamente para a Câmara Municipal de Belo Horizonte.

A jurisprudência predominante entende hoje que a inelegibilidade só é imposta quando há provas de participação, consentimento ou conhecimento da fraude. Mas como os atores diretamente responsáveis por apresentar os documentos fraudados, os dirigentes que constroem as listas de candidaturas e fazem o registro, não teriam conhecimento?

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Ainda, conforme demonstrado nos processos, algumas das candidatas fictícias fizeram campanha para os vereadores cassados, além de terem ligações com assessores deles, o que indicava envolvimento na fraude.

Já as candidatas, cujo papel no esquema se aproxima mais ao de uma vítima, já que seus dados e imagem são usados para favorecer terceiros, sofrem a sanção mais grave.

Acreditamos que seja importante uma revisão no entendimento da justiça eleitoral, na perspectiva da garantia efetiva do direito das mulheres de participarem dos processos eleitorais, e da responsabilização dos reais responsáveis pelas fraudes às cotas de candidaturas femininas, que sabemos ser a resistência partidária masculina à inclusão das mulheres e à igualdade de gênero.

Nicole Porcaro e Thais Corcetti são advogadas e Marlise Matos é do Núcleo de Estudos e Pesquisas Sobre Mulher (NEPEM/UFMG) 

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Este é um artigo de opinião. A visão das autoras não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Edição: Elis Almeida