Minas Gerais

Coluna

Quadro eleitoral indefinido: alguns fatos e observações sobre as eleições de BH

Imagem de perfil do Colunistaesd
Guilherme Bergamini - ALMG
Quadro eleitoral não está tão definido quanto às vezes se possa pensar

A primeira coisa a se comentar sobre as eleições municipais de Belo Horizonte é o contexto geral do país no qual ela ocorre, marcado pelo crescimento, nos últimos anos, da direita e, especialmente, da extrema direita. 

A esquerda brasileira não desapareceu e nem morrerá tão cedo, contrariando as previsões catastróficas, que, geralmente, baseavam-se mais em "pensamento desejoso" ou em vontade de “lacrar” com vereditos fáceis e incisivos. Continua expressiva, embora não majoritária - o que não foi nem no auge da popularidade de Lula, no fim de seu segundo mandato. 

Mas a esquerda refluiu, apesar das campanhas presidenciais heróicas de 2018, quando todas as forças políticas e socioculturais do país se uniram contra esse polo político, e de 2022, quando enfrentou uma mobilização imoral e sem precedentes da máquina estatal e uma onda de assédio eleitoral nunca vista. As dificuldades da esquerda e a maré montante da direita radical podem ser medidas, por exemplo, na composição reacionária do atual Congresso Nacional.

Nesta eleição municipal de 2024, em Belo Horizonte, tais dificuldades da esquerda têm sido maiores. 

Primeiro porque a capital mineira pendeu, nos últimos anos, para a direita. Em 2022, Bolsonaro teve pouco mais de 54% dos votos válidos dos belo-horizontinos no 2º turno. Em 2018, teve 65,59% dos votos, na eleição que disputou contra Fernando Haddad. 

É crucial que os eleitores de esquerda se mobilizem e que não só compareçam à eleição

De qualquer forma, na capital mineira, a direita vem tendo certa predominância, mesmo que de forma não tão aguda quanto em outras capitais, principalmente do Norte e Centro-Oeste. Além dessa leve predominância, a direita tem nomes fortes e cabos eleitorais expressivos em Belo Horizonte. 

Então, mesmo que, nestas eleições, a extrema direita brasileira tenha se fragmentado, com o ex-presidente não mais monopolizando esse campo, ela ainda conta com força expressiva.

A dificuldade maior na capital mineira, porém, foi a divisão da esquerda. Duas lideranças expressivas, dois ótimos nomes políticos, Rogério Correa e Duda Salabert, não conseguiram se acertar para uma  chapa única. O PT acusa Duda de personalismo e excesso de individualismo. Duda acusa o PT de pretender uma composição em que ela entraria subordinada e também aponta transfobia de parte dos petistas. Quaisquer que sejam as razões, a divisão não foi boa.

Voto útil?

Frente a essas dificuldades, eleitores de esquerda vêm discutindo, nos últimos dias, a conveniência do chamado "voto útil" no atual prefeito Fuad Noman (PSD), como forma de evitar que dois candidatos de direita, Mauro Tramonte (Republicanos) e Bruno Engler (PL), disputem o 2º turno, apoiados, respectivamente, por Zema (Novo) e Bolsonaro. 

Em primeiro lugar, é bom salientar que o apoio de Zema ao Tramonte é mais "pro-forma" do que real. O governador, provavelmente sentindo a pressão bolsonarista, não tem participado da campanha de Tramonte, nem na propaganda eleitoral e muito menos presencialmente. 

Zema está ativo na campanha em outros municípios e até mesmo em outros estados. Mas, em Belo Horizonte, quem tem se dedicado mesmo à campanha de Tramonte é o ex-prefeito Alexandre Kalil, rival do atual governador no pleito de 2022.

Dito isso, compreende-se o raciocínio para o voto útil em Noman. Evitaria um prefeito bolsonarista. Além disso, Noman  mantém boas relações com o presidente Lula e com o ministro Alexandre da Silveira, além de, supostamente, segundo as pesquisas, ser mais propenso a bater Engler ou Tramonte em um eventual 2º turno. Mas há razões também para se duvidar do acerto dessa estratégia de voto útil.

Quadro indefinido 

Noman, embora não bolsonarista, tem relações e recebeu doações de donos de empresas de ônibus e o péssimo transporte público da capital mineira é uma das principais dores de cabeça e reclamações dos belo-horizontinos. O vice de Noman é extremamente conservador, e há dúvidas sobre a saúde do atual prefeito.

A principal dúvida, porém, em relação à estratégia do voto útil progressista é que o quadro eleitoral não está tão definido quanto às vezes se possa pensar. O número de indecisos ainda é expressivo e, mesmo entre os que declaram voto em algum candidato, o chamado "voto consolidado", de quem dificilmente mudará o voto, também não é grande. 

As pesquisas eleitorais vêm tendo sérios problemas no Brasil

Quando o voto está mais consolidado, é pequena a diferença entre a pesquisa induzida, em que o entrevistador lê para as pessoas os nomes dos(as) candidatos(as), e a pesquisa espontânea, em que a pessoa declara livremente, antes de ouvir os nomes dos(as) candidatos(as), em quem pretende votar.

:: Receba notícias de Minas Gerais no seu Whatsapp. Clique aqui ::

Além do quadro não definido, as pesquisas eleitorais vêm tendo sérios problemas no Brasil. Nesta eleição municipal de Belo Horizonte, algumas pesquisas têm apresentado resultados bem díspares entre si. Ou seja, alguém está errando.

Fragilidade das pesquisas

Na eleição de 2022, os institutos de pesquisa erraram, não totalmente, mas em medida expressiva. No primeiro turno, a maioria deles não previu corretamente a votação de Bolsonaro e davam-lhe de 35% a 38%, mas ele teve 43,2%. 

A Atlas Intel "bateu na trave", indicando 41% para o ex-capitão e ficando no limite da margem de erro. Mas também errou feio, junto com todos os outros grandes institutos de opinião, na votação do Rio de Janeiro e de São Paulo, quando subestimaram os votos da direita em Cláudio Castro e Tarcísio de Freitas, respectivamente. 

Mas não foi somente o voto na direita que foi subestimado naquela eleição. Na Bahia, ninguém acertou a votação expressiva que Jerônimo (PT) teve, quase se elegendo em primeiro turno. No 2º turno da eleição presidencial de 2022, praticamente todos acertaram em prever a vitória de Lula por pequena margem. Mas os erros, em geral, especialmente no 1º turno, foram muitos. 

O fato, portanto, é que as pesquisas têm tido, muitas vezes, dificuldade em captar os movimentos, muitas vezes rápidos e subterrâneos, do eleitorado e da opinião pública, e todos os grandes institutos estão sob escrutínio nesta eleição de 2024. Prometeram calibrar as pesquisas e corrigir os erros, veremos. 

Mobilização da esquerda é fundamental

E por falar em movimentos rápidos e subterrâneos do eleitorado, uma última ponderação, dirigida às forças progressistas de Belo Horizonte. É bem provável que, nesta reta final, a extrema direita lance um ataque coordenado, especialmente nas redes sociais e na internet, “terra de ninguém” que o braço lento do judiciário tem dificuldade em controlar. Sabem que a eleição não está plenamente definida e que o esforço de última hora, com seus métodos imorais de persuasão, pode render frutos.

É crucial, então, que os eleitores de esquerda se mobilizem e que não só compareçam à eleição, mas que trabalhem, militem, conversem e tentem convencer e contagiar o mais possível outros(as) eleitores(as). Seja para colocar alguém da esquerda no segundo turno, seja, medindo os prós e os contras, pelo voto útil. Não tenham dúvida de que a direita está se mobilizando mais do que nunca. Precisamos fazê-lo também. A luta contra o neoliberalismo e o fascismo é todo dia e toda hora.

Rubens Goyatá Campante é doutor em sociologia pela UFMG e pesquisador do Centro de Estudos Republicanos Brasileiros (CERBRAS)

---

Leia outros artigos de Rubens Goyatá Campante em sua coluna no Brasil de Fato MG

Edição: Ana Carolina Vasconcelos