A escalada de violência política contra mulheres tem ganhado contornos preocupantes em Belo Horizonte. Em caso recente, após decisão liminar do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG), a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) disponibilizou imagens do sistema de câmeras de segurança que mostram o momento em que um homem corta a bandeira da vereadora, e candidata à reeleição, Iza Lourença (PSOL).
No vídeo, o homem, disfarçado, coloca um boné e óculos escuros minutos antes do ato, em seguida caminha em direção à bandeira de forma premeditada. O objeto estava exposto a 50 metros do comitê da campanha, no Centro da capital mineira.
“Quando rasgam o rosto de uma mulher, na verdade, enviam um recado para toda a sociedade. É como se dissessem que nós, mulheres negras, jovens, LGBTQIAPN+, não devêssemos ocupar a política e os espaços de poder. Mas não vão nos calar e muito menos interromper nossas lutas contra a extrema direita e por uma cidade onde a periferia esteja no centro do orçamento”, declarou Iza Lourença, em resposta ao ataque.
Transfobia
A candidata Juhlia Santos (PSOL) também foi vítima de violência. Depois de processar o deputado federal Nikolas Ferreira (PL), e o seu candidato à vereança em BH Vile Santos (PL) por publicar conteúdo transfóbico em suas redes sociais, obteve vitória na Justiça. O TRE-MG ordenou a retirada imediata de um vídeo dos perfis de ambos os políticos.
Na publicação em questão, o político supõe que um aluno foi agredido por outras duas alunas trans pois não queria beijá-las. Em seguida, faz comentários preconceituosos.
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“Primeiro que o menino não é obrigado a beijar ninguém, ainda mais o Sebastião, que agora quer ser chamado de Rosana. E outra, se ele revidar e bater na versão feminina vão dizer que ele está batendo numa mulher. Se bater na versão masculina a acusação será que ele é transfóbico?”, diz. “Você pode se identificar como você quiser, mas as pessoas ao seu redor não são obrigadas a concordar com a sua realidade”, continua, em vídeo que já foi retirado das redes sociais.
Juhlia Santos reforçou que, independente do resultado das eleições, tem se movimentado para barrar o retrocesso e enfrentar as violências que ameaçam a existência de pessoas trans.
“É preciso transformar a Câmara Municipal de Belo Horizonte, um espaço historicamente racista, machista e transfóbico em uma casa que respeite a diversidade. Vamos combater de forma incisiva as ações transfóbicas e garantir que nossos direitos sejam respeitados. Estamos aqui para lutar por igualdade e fazer o compromisso de que nossa voz será um instrumento de mudança. Não podemos tolerar o racismo, a transfobia e todas as formas de opressão”, afirmou.
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Desafio é recorrente
Os episódios recentes de violência não são casos isolados. Luana de Souza (PT), também candidata a vereadora, denunciou, no dia 13 de setembro, tentativas de invasão em suas redes sociais e vandalismo constante em seu material de campanha.
“Nossos Windbanners também estão sendo quebrados todos os dias. Já foram mais de dez.
Pra gente só significa que estamos incomodando os fascistas. E incomodaremos cada vez mais porque vai ter mulher preta de luta na Câmara de Belo Horizonte sim”, reafirmou, por meio de suas redes sociais.
Iniciativas
A Câmara Municipal de Belo Horizonte aprovou em segundo turno, em setembro, um projeto de lei (PL) com objetivo de prevenir e responsabilizar comportamentos e atitudes violentas na política.
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A medida estabelece formas de proteger e denunciar ações individuais ou coletivas, que afetem, direta ou indiretamente, mulheres candidatas, eleitas ou nomeadas para cargos ou funções públicas.
O PL foi uma iniciativa das vereadoras do PSOL, Iza Lourença e Cida Falabella, vítimas de ameaças de morte e estupro, desde outubro de 2023. As parlamentares Professora Nara (Rede) e Professora Marli (PP) também foram proponentes do projeto.
Violência política de gênero é ameaça à democracia
Em entrevista ao Brasil de Fato MG, a professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (Nepem-UFMG) Marlise Matos, lembrou que a violência política de gênero é uma estratégia grave de ameaça ao sistema democrático do Brasil, uma vez que atinge mulheres em todas as posições de liderança, como candidatas, parlamentares, representantes de movimentos populares e sindicatos.
“A democracia se constrói, e faz isso com muita dificuldade, a partir de vozes, pensamento e perspectivas plurais”, comentou. Tentar silenciar as mulheres por meio de coerção e violência, segundo ela, vai contra os princípios democráticos.
A pesquisadora acredita que a sociedade precisa acolher e recepcionar as mulheres com dignidade e igualdade, considerando, sobretudo, as diversidades, como é o caso das mulheres negras, trans e indígenas. “O sistema político é avesso a essas mulheres”, lamenta.
Edição: Elis Almeida