Sob a gestão de Romeu Zema (Novo), o sistema prisional em Minas Gerais enfrenta uma crise marcada pela superlotação, precarização dos serviços e decisões controversas, como a proibição do uso de cigarros nas unidades. Essas questões geram impactos profundos na saúde dos detentos, na segurança das unidades e na relação com os familiares, segundo lideranças e especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato MG.
A deputada estadual Andreia de Jesus (PT), presidenta da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), destaca que a superlotação é uma das principais causas da deterioração das condições de vida dentro das prisões.
“O atendimento odontológico é quase inexistente e a saúde mental é negligenciada, tanto para os presos quanto para os trabalhadores. Enquanto isso, as equipes de assistência social e educação diminuem e o número de policiais penais cresce apenas para conter os detentos, sem oferecer qualquer forma de ressocialização”, afirma.
Atualmente, grande parte das unidades prisionais de Minas está superlotada, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Na capital e na Região Metropolitana, por exemplo, entre 21 penitenciárias, presídios e centros de remanejamento inspecionados pela Justiça, 16 têm mais presos do que vagas.
Além disso, o CNJ também aponta que 69% dos 218 presídios do estado estão em condições regulares, ruins ou péssimas.
Um sistema que precisa de mudança
Andréia também aponta para os contratos milionários relacionados à alimentação, que, segundo ela, “não oferecem nenhuma qualidade”. Ela defende a reintegração das cozinhas nas unidades prisionais, com os próprios presos participando do preparo das refeições.
“Isso reduziria custos, evitaria desperdícios e impediria casos de comida azeda sendo servida, como ocorre hoje”, afirma.
A deputada também denuncia a existência de “tortura institucionalizada”, evidenciada pela falta de atendimento médico, odontológico e pela recorrência de doenças como problemas de pele e pulmonares. Para ela, esse cenário gera um “caldeirão prestes a explodir a qualquer momento”.
Proibição do cigarro e impactos
Uma decisão recente do governo estadual proibindo o cigarro nas prisões também tem gerado controvérsias. Segundo Robson Souza, presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (Conedh), a medida atende aos interesses da Polícia Penal, mas ignora os impactos na saúde e nos direitos individuais dos presos.
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“Essa decisão foi implementada de forma autoritária e abrupta, gerando danos à saúde dos presos e reflexos diretos na segurança das unidades prisionais”, analisa.
Segundo ele, o Conedh recebeu diversas denúncias e questionou o Departamento Penitenciário de Minas Gerais (Depen), o Ministério Público e outros órgãos sobre a medida.
Ainda de acordo com Robson, o conselho está colaborando com a Defensoria Pública (DP) na elaboração de uma ação civil pública para contestar a decisão. Contudo, uma tentativa inicial da DP para derrubar o decreto foi rejeitada pelo Judiciário, que considerou a proibição uma questão de saúde pública.
Privatização e “indústria do aprisionamento”
A possibilidade de privatização do sistema prisional também preocupa especialistas. Souza alerta para a tentativa de governos de direita e de extrema direita de importar um modelo de gestão prisional inspirado nos Estados Unidos, que transforma as prisões em empreendimentos lucrativos.
“O Brasil já tem uma verdadeira ‘indústria do aprisionamento’. Muitas empresas lucram com contratos de alimentação e outras áreas, mas a privatização em larga escala enfrenta obstáculos, devido ao controle do sistema por facções criminosas, o que aumenta os riscos para operadores privados”, pondera.
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A deputada Andreia de Jesus concorda e reforça que a lógica atual do sistema prisional é punitiva e seletiva, voltada para o encarceramento em massa de pessoas pobres, negras e jovens. Ela denuncia que a “justiça seletiva” perpetua as desigualdades e opera em conluio com interesses econômicos e políticos, refletindo uma mentalidade autoritária presente na sociedade.
A necessidade de mudanças estruturais
Tanto Robson quanto Andréia destacam que mudanças no sistema prisional vão além de ações governamentais. Para eles, é necessário ressignificar valores fundamentais, como a dignidade humana, e promover uma cultura de direitos humanos.
“Enquanto não entendermos que a prisão deve ser o último recurso e que o objetivo deve ser a reabilitação, continuaremos com um sistema que mata, aprisiona e segrega”, afirma a deputada.
Para Robson, o sistema prisional brasileiro é reflexo de uma sociedade que legitima medidas punitivas contra os mais vulneráveis, tornando urgente o debate sobre justiça e direitos humanos.
“Governos de extrema direita, de fato, promovem políticas ainda mais violentas e punitivas, mas governos de esquerda também reproduzem, muitas vezes, práticas similares. A mudança necessária não é apenas no âmbito governamental, mas também na cultura e na mentalidade da sociedade”, analisa.
Edição: Ana Carolina Vasconcelos