A Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) rejeitou, na manhã desta quarta-feira (4), o projeto de lei ( PL) que previa a isenção do pagamento do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) para empresas privadas responsáveis pelo transporte público de ônibus da capital mineira. A medida, que foi enviada ao Legislativo pela prefeitura, ficou conhecida como “bolsa empresário”.
Foram contrários à proposta 23 vereadores, enquanto 17 deram voto favorável ao PL 1019/2024. Para o economista e integrante do movimento Tarifa Zero BH André Veloso, o projeto era “oportunista” e “mal justificado”.
“A isenção de impostos é sempre um pedido das empresas de ônibus e raramente isso se traduz em redução de preços. A prefeitura argumenta que parte do imposto cobrado tem que ser pago na forma de subsídio, mas essa proporção é um terço, sendo generosa. Então, é uma forma ruim de fazer a discussão sobre os custos de transporte e sobre a própria concessão”, argumenta.
Caso o PL tivesse sido aprovado, o valor da renúncia fiscal seria de aproximadamente R$ 4,2 milhões por mês. O ISSQN é cobrado pelas prefeituras de todo o país e tem alíquotas entre 2% e 5%.
Isenção chegaria a R$ 50 milhões
Abrir mão dessa receita também significaria reduzir recursos investidos em áreas essenciais, já que a Constituição Federal prevê que os municípios devem investir pelo menos 25% da receita de impostos em educação e 15% em saúde.
Uma estimativa do movimento indica que o recolhimento anual é de aproximadamente R$ 50 milhões que, em caso de renúncia, significaria a redução de R$ 12,5 milhões a ser gasto com educação e R$ 7,5 milhões com saúde.
Justificativa insuficiente
Desde 2022, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) concede subsídio financeiro às empresas que administram o transporte público da capital, como forma de evitar o aumento do valor cobrado ao usuário dos ônibus.
Atualmente, o ISSQN incide sobre o custo, que é bancado em aproximadamente um terço pelo subsídio. Dessa forma, a PBH argumentou, ao apresentar o PL, que reduzindo o imposto, diminuiria também o valor do subsídio. Porém, André Veloso explica que não é bem assim.
“Não existe tanta clareza sobre todas as estruturas de custos, e o principal, na verdade, não é nem a questão do subsídio, mas a questão das atuais empresas e da atual concessão. Existem muitos indícios de que as empresas formaram cartel e supostamente fraudaram a licitação em 2008”, defende.
“Há muitos indícios também de descumprimento do contrato, não pagamento de multas, etc. Então, isso torna uma isenção fiscal politicamente muito errada”, continua o economista.
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Para 2025, já está aprovado no orçamento R$ 723 milhões a serem destinados em subsídio às empresas. Até outubro de 2024, a PBH pagou R$ 594,8 milhões aos empresários do setor.
Essa vitória é de quem trabalha, paga impostos e usa transporte público
A vereadora Iza Lourença (PSOL) relembra que as empresas de ônibus já haviam passado quase uma década sem pagar impostos em Belo Horizonte. Foi por meio da realização de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), conduzida pela atual deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL) na CMBH em 2021, que a regra passou a ser diferente.
“Com os ônibus superlotados, sem cumprir horários e sem nenhuma qualidade, seria justo as empresas ainda não pagarem impostos? Derrotamos o PL proposto pelo prefeito. Essa vitória é de quem trabalha, paga seus impostos e tem que utilizar um transporte público decadente”, comentou Iza Lourença, nas redes sociais.
Caminho é mudança do contrato
Segundo um relatório de custos do Sistema de Transporte Público Coletivo Convencional por Ônibus (STPCCO) de Belo Horizonte, construído em 2022 e publicado pela Superintendência de Mobilidade do Município de Belo Horizonte (Sumob) em 2023, existem 35 empresas que operam o serviço na cidade.
Em 2008, a PBH celebrou contratos de concessão com 4 consórcios, que passaram a ser responsáveis pelas redes de transporte e serviços (RTS) da cidade. A responsabilidade foi distribuída de acordo com a divisão do município em 4 áreas.
As regiões de Venda Nova e da Pampulha ficaram com o Consórcio Pampulha. Norte, Nordeste e Leste com o Consórcio BH Leste. Barreiro e Oeste com o Consórcio 10 e, por fim, a Noroeste com o Consórcio Dom Pedro II.
Na avaliação de André Veloso, os contratos estão na raiz do problema do sistema de transporte público de Belo Horizonte e, na realidade, o que a prefeitura deveria fazer é antecipar o fim da concessão.
“E fazer uma discussão profunda, ampla, participativa, corajosa e criativa sobre a nova licitação e a nova concessão. A questão é que essas atuais empresas não têm idoneidade para operar em BH. Elas têm questões fiscais, questões trabalhistas, e sem contar todas as vezes que a gente é humilhado nos ônibus”, defende.
“Isso deveria contar para modelar uma licitação que trouxesse novos atores. Estamos falando de uma licitação particionada, em que as garagens sejam públicas e não licitadas, que a bilhetagem eletrônica seja de controle da prefeitura e que seja licitado apenas o fornecimento de veículos”, continua.
O economista acredita que, assim, a cidade poderia inclusive atrair empresas internacionais, como as chinesas, que atuam com veículos elétricos, além de ampliar o poder econômico e político da prefeitura em relação ao sistema de transportes e possibilitar o controle de custos e de qualidade.
Edição: Elis Almeida