Minas Gerais

ARTIGO DE OPINIÃO

Diamantina (MG), patrimônio histórico e artístico mundial, é ameaçada pela mineração de ferro

Projeto visa explorar 300 mil toneladas/ano de ferro

Belo Horizonte (MG) | Brasil de Fato MG |
Reprodução - Foca Lisboa/UFMG

O município de Diamantina, localizado no alto do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, a cerca de 292 quilômetros de Belo Horizonte, é um local destacado internacionalmente pelo seu patrimônio histórico e artístico, reconhecido pela Unesco em 1999. 

O município destaca-se pelas belezas naturais e pela preservação dos ecossistemas e, por esse motivo, é um espaço que atrai inúmeros turistas, em todas as épocas do ano. 

Diamantina também é um polo universitário, abrigando três instituições: a Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e do Mucuri (UFVJM), Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) e Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG), recebendo inúmeros estudantes de várias regiões do país. 

O reconhecimento internacional se estende às comunidades tradicionais das apanhadoras de sempre-vivas, que, desde 2020, integram o patrimônio agrícola mundial pela FAO/ONU.  

Apesar da relevância e das múltiplas possibilidades socioeconômicas para o município, existe a ameaça de mineradoras que enxergam Diamantina apenas como fonte de extração dos minérios e de obtenção de  riquezas. Não se trata do garimpo tradicional, exercido historicamente por grupos comunitários. Trata-se de grupos econômicos vindos de outras regiões, que desejam explorar a área. 

Avanço da mineração

O militante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM) e pesquisador Guto Lopes aponta, em sua pesquisa de doutorado, que Diamantina, nas últimas décadas, observou um aumento significativo de empreendimentos minerários. 

Mesmo que essas empresas sejam de pequeno porte, de origem familiar e de capital nacional, elas têm se beneficiado das mudanças na legislação ambiental e da leniência de administrações públicas, tanto estadual quanto municipal. Recentemente, o Plano Diretor do município foi alterado para atender aos interesses dessas mineradoras. 

Esses pequenos projetos minerários representam um grande desafio político e econômico. Entre eles, destaca-se o projeto Mosquito da empresa ETGRAN Mineração, que atualmente é um dos maiores empreendimentos de mineração de ferro planejado para a região. 

Entre tantos projetos que estão instalados no município, atualmente, a mineração em pequena escala se encontra em todos os distritos. 

A chegada do empreendimento de ferro representa um risco ainda maior. Com a promessa de progresso e desenvolvimento, essas empresas buscam impor um novo uso para o território, provocando uma mudança substancial na economia local. Longe de representar uma saída para os graves problemas sociais, o que se observa é um aprofundamento da desigualdade, associada à destruição ecológica. 

O povo encontra-se sob fogo cruzado. Sobretudo após os crimes de Mariana e Brumadinho, percebemos um movimento de fortalecimento das atividades de mineração em menor escala, apoiada por um número significativo de pequenas empresas que servem de suporte para a grande mineração. 

Na última década, assistimos à explosão dessa modalidade de mineração e o Norte de Minas e Vale do Jequitinhonha foram as regiões com o maior crescimento. O extrativismo mineral chegou mais longe do que podemos imaginar. Estão em praticamente todos os municípios mineiros, extraindo todos os recursos possíveis.

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Apesar do avanço da mineração sobre os territórios, a Compensação Financeira por Exploração Mineral (CFEM) arrecadada em Diamantina em 2024, até o momento, é de menos de R$ 500 mil, o que representa um valor irrisório, quando comparada com a arrecadação total do município, que, em 2023, atingiu mais de  R$ 300 milhões em receitas. 

Impactos

A atividade minerária se desenvolve pela degradação ambiental e pela precarização dos trabalhadores e das trabalhadoras, impactando negativamente a vida das pessoas que vivem em áreas atingidas. 

Chegada massiva de pessoas de fora da região, destruição de recursos naturais, viver com medo ao lado de barragens ou pilhas de rejeitos, barulhos, destruição de estradas, explosões, poeiras, exploração sexual e infantil e deslocamentos forçados são alguns dos problemas causados pela mineração predatória. 

Apesar da existência de mineradoras tidas como ‘pequenas’, famílias do distrito de Conselheiro Mata, reconhecido pelo turismo ecológico, já relatam sentir os impactos da chegada das mineradoras. 

Para além de trazer prejuízos aos territórios próximos à extração dos minérios, verifica-se entraves também econômicos para a região: turistas continuarão a vir para Diamantina com trajetos mais demorados? turistas continuarão a vir para o município com a natureza destruída? a comunidade deseja que o vínculo de sociabilidade seja alterado? 

São perguntas a serem feitas, diante da possibilidade da mineração, além de todos os riscos existentes, ser um ‘mal negócio’ e reduzir as arrecadações ao município. 

O perigo do Projeto Mosquito

O novo capítulo dessa história se destaca com a existência do Projeto Mosquito, que ironicamente homenageia o nome do rio a ser atingido, pela Etgran Mineração LTDA. Trata-se de um empreendimento a ser implementado a apenas 6 quilômetros do Parque Estadual de Biribiri, destino comum dos turistas e moradores da região. 

Trata-se de um projeto que visa explorar 300 mil toneladas/ano de ferro, construindo pilhas de rejeitos e estradas e impactando novas comunidades rurais. Visualiza-se a movimentação de 25 caminhões por dia nas estradas que ligam a mina. 

A previsão é de criação de apenas 29 empregos diretos e 29 empregos por meio de empresas terceirizadas. A área da mineração está no início da bacia do Rio Jequitinhonha, abarcando duas sub-bacias, a do rio Pinheiro e a do Caeté-Mirim. 

Além disso, verifica-se a existência de interferências diretas nos vínculos sociais, na fauna e na flora. Tal atividade impacta diretamente o município de Diamantina, que hoje encontra-se ameaçado pelas atividades minerárias. 

A mineração em Diamantina se desenvolve sem nenhuma consulta e diálogo com a sociedade civil. A população precisa ser ouvida e consultada sobre tais empreendimentos. A preocupação é que o projeto da Etgran seja a ponta de um iceberg, pois existem indícios, como a composição do Conselho Municipal do Meio Ambiente e a definição das áreas no Plano Diretor do município, de que os atores políticos do município atuam para implementar a chegada de novos processos minerários. 

Diamantina, um município tão potente e com toda sua riqueza cultural, natural  e histórica,  encontra-se ameaçada pelo avanço desordenado e  irresponsável da mineração. É fundamental que a sociedade seja ouvida e que tenha um diálogo com a comunidade local, priorizando alternativas sustentáveis para o desenvolvimento da região. 

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Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

 

Edição: Ana Carolina Vasconcelos